domingo, 21 de agosto de 2011

ECA - COMENTÁRIOS A LEI 8.069/1990

Capítulo 1 – Disposições Preliminares.

1.1. Doutrina da Proteção Integral:


Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº. 8.069/1990) segue a doutrina da proteção integral, que se baseia no princípio do melhor interesse da criança. O Estado brasileiro tem o dever de garantir as necessidades da pessoa em desenvolvimento (até 18 anos de idade), velando pelo seu direito a vida, saúde, educação, convivência, lazer, liberdade, profissionalização e outros (artigo 4º, ECA), com o objetivo de garantir o “desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade” (artigo 3º, ECA).


O novo Estatuto afastou-se da doutrina de situação irregular, acolhida pelo Código de Menores (Lei nº. 6.697/1979), que tinha como objeto apenas os menores em conflito com a lei ou aqueles privados de assistência.


A doutrina da proteção integral nasceu no IX Congresso Panamericano Del Niño, realizado em Caracas, em 1948, e no X Congresso Panamericano Del Niño, realizado no Panamá, em 1955.





Sua consolidação, entretanto, ocorreu apenas no Congresso Panamericano, de 1963, em Mar Del Plata, Argentina, e na Convenção Interamericana de Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica, em 1969, cujo artigo 19 estabeleceu: “Toda criança tem o direito de proteção que sua condição de menor requerer, por parte da família, da sociedade e do Estado”.





No Brasil, a doutrina da proteção integral foi proclamada no artigo 227 da Constituição de 1988, que fixou a questão do menor como prioridade absoluta, dever da família, sociedade e estado.





A Convenção dos Direitos da Criança, aprovada pela ONU em 20/11/1989, assinada pelo Brasil em 26/01/1990, aprovada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº. 28, de 14/09/1990, as Regras de Beijing (Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude), as Diretrizes de Riad (Diretrizes das Nações Unidas para a Prevenção da Delinqüência Juvenil) e as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Proteção dos Jovens Privados de Liberdade foram textos em que também se baseou o legislador para elaboração do ECA.





1.2. A quem se aplica:



Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.(SE APLICA AO JOVEM)
Vide também o disposto no artigo 228 da Constituição Federal.


Baseado na psicologia evolutiva e adotando o critério cronológico absoluto, o artigo 2º estabelece a diferença técnica entre criança e adolescente, evitando o uso do termo menor, que se referia à doutrina de situação irregular.





A distinção é relevante, principalmente no que se refere à prática de ato infracional, porque ao adolescente infrator podem ser aplicadas medidas protetivas (artigo 101) e sócio-educativas (artigo 112), ao passo que à criança infratora somente pode ser aplicada medida protetivas.



Considera-se, para os efeitos da lei, a idade à data do fato e, embora exista divergência jurisprudencial, a corrente dominante entende que a adolescência e a maioridade penal são atingidas no primeiro instante do dia do aniversário em que se completam 12 ou 18 anos de idade, respectivamente.


1.2.1. Aplicação excepcional entre 18 e 21 anos de idade:
O parágrafo único do artigo 2º prevê a possibilidade de aplicação do estatuto ao jovem adulto (entre 18 e 21 anos de idade incompletos), excepcionalmente e nos casos expressos em lei. Mônaco da Silva critica a redação do dispositivo, asseverando que “à falta de explícito esclarecimento, há de se entender que a lei a que se refere o texto, é tanto a de nº. 8.069/1990 (ECA) quanto outra de natureza similar ou não”.





A exceção abrangia, por exemplo, o deferimento da tutela (art.36), a adoção de maiores de 18 anos que já estavam sob guarda ou tutela dos adotantes (art.40), representação de menores púberes e impúberes (artigo 142) e competência para conceder a emancipação - JUSTIÇA DA iNFÂNCIA E DA JUVENTUDE(artigo 148, parágrafo único, e) e a aplicação das medidas protetivas e sócio-educativas.



Com a redução da maioridade civil para 18 anos (artigo 5º, Código Civil), houve também diminuição da idade limite para o deferimento da tutela (artigo 1.728, Código Civil), para a emancipação (artigo 5º, I, Código Civil) e para a representação e assistência (artigos 1.634, V, e 1.690, Código Civil), levando à conseqüente revogação parcial dos artigos 36, 142 e 148, parágrafo único, e, do ECA.





No caso das medidas sócio-educativas, entende-se que a exceção (artigo 2º, parágrafo único) atinge somente as de internação e de semiliberdade, porque expressamente previstas no ECA (artigos 120, § 2º, e 121, § 5º).





É importante notar que, embora a internação e a semiliberdade possam persistir após os 18 e até os 21 anos, somente podem ser aplicadas em decorrência de fatos praticados antes da maioridade penal. Fatos típicos praticados depois dos 18 anos são da competência da Justiça Penal.



1.3. Garantias Fundamentais:
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento, físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.



Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.



Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.





O artigo 3º resume os princípios 1 e 2 da Declaração dos Direitos da Criança, das Nações Unidas. Os artigos 4º e 5º foram extraídos do artigo 227 da Constituição Federal.
Dando continuidade à doutrina da proteção integral, o Estatuto estabelece nesses dispositivos os direitos específicos da criança e do adolescente, além de outros, inerentes à universalidade dos seres humanos.





Infelizmente, o Estado tem sido o primeiro a descumprir os preceitos por ele próprio estatuídos. Em vez de implementar prioritariamente os direitos garantidos pela legislação especial, relega a questão de crianças e adolescentes a um plano inferior, haja vista a insuficiência de escolas, de hospitais especializados e de clínicas para tratamento de dependentes químicos.




1.4. Regra de Interpretação:
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
Na redação do artigo 6º, o legislador repetiu o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, acrescentando os direitos e deveres individuais e coletivos, bem como a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.





Essa condição, nas varas da Infância e da Juventude, deve ser tratada como prioridade sobre quaisquer outros fatores. O juiz deve ter sempre em mente o fato de a criança e o adolescente serem sujeitos especiais, merecedores de atenção jurídica e social preferencial. A prioridade, contudo, não deve conduzir ao entendimento de que tais direitos são absolutos. Quando se consagrou o princípio da proteção integral, não se pretendeu aniquilar os demais direitos individuais e coletivos.

Capítulo 2 – Direito à Vida e à Saúde.

2.1. Direito à Vida e à Saúde:
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.





Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal.





§ 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema.




§ 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal.


§ 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem.




§ 4o Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período b inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)



§ 5o A assistência referida no § 4o deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)



O artigo 7º reproduz os dois primeiros direitos elencados no artigo 227, CF, e o artigo 8º remete, implicitamente, ao seu artigo 198, que trata do Sistema Único de Saúde.




2.2. Leite Materno:
Art. 9º O poder público, as instituições e os empregadores propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade.
Considerando que o leite materno é o único alimento necessário para o recém-nascido durante os primeiros seis meses de vida, e, portanto, de grande importância para o desenvolvimento da criança, cabe ao Estado a garantia de sua implementação, por meio do Sistema Único de Saúde, que deve propiciar atendimento integral à gestante.


O Brasil, em termos de lei, é um dos países mais avançados do mundo na proteção do aleitamento materno e no direito da criança à amamentação. A Constituição garante 120 dias de licença-maternidade-desde a confirmação da gravidez- (artigo 7º, XVIII) e a estabilidade no emprego durante a amamentação - até cinco meses após o parto-(artigo 10, II, b, ADCT).
Vide também art. 396 da Consolidação das Leis Trabalhistas.



Para garantir o acesso ao leite materno, o Ministério da Saúde, por meio da Portaria 322, de 26/05/1988, editou normas regulamentadoras dos Bancos de Leite Humano.



Em 01/08/1990, o Brasil assinou, na Itália, a Declaração de Innocenti, para proteção e incentivo ao aleitamento materno.



Às presidiárias, o direito à amamentação é garantido (artigo 5º, L, CF). Em caso de proibição do exercício desse direito aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade, o remédio jurídico é o mandado de segurança.




2.3. Atendimento Médico:
Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são obrigados a:
I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos;
II - identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa competente;
III - proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais;
IV - fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato;
V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe.




O artigo 10 discrimina as obrigações dos estabelecimentos de saúde, que visa coibir a troca acidental ou não de crianças recém-nascidas no hospital.A ausência, dolosa ou culposa, do registro a que alude o artigo 10, I, pode configurar a figura penal do artigo 228, ECA.



A ausência do teste do pezinho para detecção de fenilcetonúria e hipotireoidismo congênito implica o delito do artigo 229, ECA.



Art. 11. É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. (Redação dada pela Lei nº 11.185, de 2005)



§ 1º A criança e o adolescente portadores de deficiência receberão atendimento especializado.
§ 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação.

Em se tratando de direito fundamental da pessoa humana, a saúde deve ser garantida pelo Estado em todos os seus planos e aspectos. O atendimento integral à saúde abrange tanto a assistência médico-hospitalar, como o fornecimento de medicamentos, o apoio psicológico, o tratamento para dependentes químicos e outros (veja também os artigos 196, 198 e 203, IV, CF).




Importa ressaltar que o Estado crie mecanismos com a finalidade de efetivar esses direitos. A omissão estatal pode ensejar propositura de Ação Civil Pública, ou, em nível individual, mandado de segurança, estando o Ministério Público também legitimado ativamente (artigo 201, IX, ECA).



2.4. Direito a acompanhante da genitora:
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente.



O dispositivo aplica-se a hospitais tanto da rede pública quanto privada, bem como procura facilitar a recuperação dos doentes, que é acelerada pela presença dos familiares. No mesmo sentido, artigo 10, V, ECA.


2.5. Maus-tratos:
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.
Parágrafo único. As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)



Estão obrigados a efetuar a comunicação de que trata o dispositivo médicos, professores, responsáveis por estabelecimentos voltados à saúde, ensino fundamental, pré-escola ou creche (artigo 56, ECA). O descumprimento implica as sanções administrativas do artigo 245, ECA.
Quando não existir Conselho Tutelar, ou em sendo caso de suspensão do poder familiar ou concessão de guarda, a autoridade judicial deve ser imediatamente comunicada (artigo 262, ECA).



A polícia também pode ser acionada, visando a instauração de inquérito, quando se vislumbre a hipótese de ocorrência de crime. Sobre o delito de maus-tratos, vide também o artigo 136, CP.



A comunicação não implica o crime previsto pelo artigo 154, CP (violação de segredo profissional), porque a determinação legal configura justa causa, uma vez que o sigilo profissional não pode ser colocado como empecilho à proteção de crianças e adolescentes.



Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
Parágrafo único. É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. O dispositivo resume as atribuições cometidas ao Sistema Único de Saúde pela Constituição Federal (artigo 200, I a IV).




Caso haja omissão dos pais ou responsáveis por qualquer razão, deverão ser tomadas medidas legais. Em havendo omissão do Estado quanto à implementação dos programas referidos, é possível a propositura de Ação Civil Pública.

Capítulo 3 – Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade.

3.1. Direitos Humanos Fundamentais:




Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.



A Constituição, tratando desses direitos, dividiu-os em cinco categorias: individuais e coletivos, sociais, de nacionalidade, políticos e de organização partidária. Como pessoas em processo de desenvolvimento, à criança e ao adolescente, devem ser garantidos pelo Estado todos os direitos que lhe forem compatíveis. Nesse sentido, o legislador pretendeu reforçar a noção de que, dentre as garantias fundamentais, o direito à liberdade, ao respeito e à dignidade formam a base necessária ao sadio desenvolvimento do ser humano.



3.2. Direito à Liberdade:
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais;
II - opinião e expressão;
III - crença e culto religioso;
IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI - participar da vida política, na forma da lei;
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.



Depois do direito à vida, a liberdade é, sem dúvida, o maior dos anseios do homem. Por essa razão, entendeu o legislador ser conveniente explicitá-la.



3.2.1. Liberdade de Locomoção:
Iniciou o legislador pela liberdade de locomoção (artigo 5º, XV, CF).
Os logradouros públicos compreendem avenidas, ruas, largos, jardins e outros locais semelhantes. Os espaços comunitários englobam entidades de amigos de bairro, associações desportivas, salões de festa, estádios de futebol, galerias de arte etc.




A liberdade de locomoção não é absoluta e pode sofrer limitações, as quais podem ser encontradas no próprio Estatuto (artigos 75, 80, 83 e 85), bem como na legislação extravagante, como por exemplo, a proibição de dirigir veículos automotores.




Também se reconhece aos pais ou responsáveis, no exercício do dever de educação, a possibilidade de cercear a liberdade do menor, coibindo certas atividades danosas ao sadio desenvolvimento. Fora das restrições legais, qualquer limitação ao direito de locomoção do menor pode ser sanada por habeas corpus (artigo 5º, LXVIII, CF). Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, fora das hipóteses de flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente, é conduta que pode configurar o crime previsto no artigo 230, ECA. Cuja pena é de 6 meses a 02 anos de detenção.



3.2.2. Liberdade de Pensamento:
A liberdade de opinião e expressão ou liberdade de pensamento (artigo 5º, IV, CF) é essencial para qualquer sociedade democrática e indispensável à formação da personalidade da pessoa em desenvolvimento. A liberdade de opinião, enquanto maneira de pensar, de analisar ou de julgar determinado acontecimento, não conhece limitações, porque de foro íntimo, já a liberdade de expressão recebe balizas no ordenamento jurídico, pois seria inconcebível permitir que um adolescente pudesse livre e impunemente atacar a honra de terceiro.



3.2.3. Liberdade Religiosa:
Desdobramento da liberdade de pensamento e manifestação, também é preceito constitucional (artigo 5º, VI, CF). A liberdade religiosa compreende não apenas a crença em si, como também o culto, o dogma, a moral e a liturgia, englobando, inclusive, o direito de não professar nenhuma fé.
Como regra, o ensino religioso tem início no seio da família e, por isso, o menor acaba por professar a crença dos pais. Entretanto, a criança e o adolescente estão livres para seguir qualquer orientação que pretendam. As escolas não podem exigir de seus alunos a freqüência de aulas de religião.
Veja também o disposto nos artigos 94, XII, e 124, XIV, ECA.
"Art. 94. As entidades que desenvolvem programas de internação têm as seguintes obrigações, entre outras:



XII - propiciar assistência religiosa àqueles que desejarem, de acordo com suas crenças;



Art. 124. São direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes:



XIV - rceber assistênia religiosa, segundo a sua crença e desde que assim o deseje;.






A ofensa à liberdade de religião pode configurar, dependendo do que consistir, os crimes dos artigos 140, § 3º (injúria qualificada) ou 208 (ultraje a culto), ambos do Código Penal.



Como as demais liberdades, a religiosa conhece limitações. A Constituição garante o livre exercício dos cultos religiosos enquanto não forem contrários aos bons costumes e à ordem (tranqüilidade e sossego públicos).



3.2.4. Liberdade de brincar, praticar esportes e divertir-se:
Corolário ao direito social de lazer (artigo 6º, CF), a liberdade de brincar, praticar esportes e de divertir-se busca garantir à criança e ao adolescente, o espaço mínimo indispensável ao seu sadio desenvolvimento. O direito à liberdade de brincar, também encontra limites (artigos 74 a 80, ECA).



"Art. 74. O poder público, através do órgão competente, regulará as diverssões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada.
Parágrafo Unico. Os responsáveis pelas diverssõe e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, formal destacada sobre a natureza do espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificão."




Ainda no aspecto lazer, é bom lembrar que a Lei nº. 11.104, de 21/03/2005, determinou a obrigatoriedade de os hospitais que ofereçam atendimento pediátrico manter brinquedotecas em suas dependências.



3.2.5. Liberdade de participar da vida familiar e comunitária:
Antes de se integrarem à sociedade, é preciso que a criança e o adolescente interajam com a própria família (artigo 227, CF).
Da mesma forma, deve ser permitida à criança e ao adolescente a interação na vida comunitária, através de sua presença nos eventos sociais, para que possam desenvolver o espírito de cidadania.



3.2.6. Liberdade de participação na vida política:
O alistamento eleitoral e o direito de voto são facultativos para os adolescentes maiores de 16 e menores de 18 anos (artigo 14, § 1º, II, CF). Não são eles elegíveis, já que a Constituição exige a idade mínima de 18 anos para o cargo de vereador (artigo 14, § 3º, VI, d, CF).



3.2.7. Liberdade de buscar refúgio, auxílio e orientação:
O dispositivo destina-se ao menor em situação de risco, que deve, nos termos do artigo 4º, parágrafo único, a, receber, com primazia, proteção e socorro.



3.3. Direito ao Respeito:
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.



3.3.1. Direito à inviolabilidade física, psíquica e moral:
A criança e o adolescente, mesmo apreendidos em flagrante pela prática de ato infracional, devem ser respeitados em suas peculiaridades e não podem sofrer qualquer lesão, por menor que seja, à sua integridade física, psíquica ou moral.
Vide o artigo 178, ECA. "Art. 179. Apresentado o adolescente, o representante do Ministério Público, no mesmo dia e à vista do auto de apreensão boletim de ocorrência ou relatório policial, devidamente autuados pelo cartório judicial e com informações sobre os antecedentes do adolescente, procederá imediata e informalmente à sua oitiva e, em sendo possível, de seus pais ou responsável, vítima e testemunhas.
Parágrafo Único. Em caso de não apresentação, o representante do Ministério Público notificará os pais ou responsável para apresentação do adolescente, podendo requisitar o concurso das polícias civil e militar."



A regra legal aplica-se a toda e qualquer pessoa que encontre-se responsável pelo menor (artigo 18, ECA), inclusive os estabelecimentos de ensino (artigo 53, II, ECA) e as entidades que desenvolvem programas de internação (artigo 94, IV e VII, 124, V, e 125).



O desrespeito a essa norma poderá configurar lesão corporal (artigo 129, CP), maus-tratos (artigo 136, CP) ou até o delito de tortura (Lei nº. 9.455, de 07/04/1997).



3.3.2. Direito à preservação da imagem:
A regra constitucional de preservação da imagem (artigo 5º, X, CF) busca resguardar a reputação e a autoestima das pessoas, assegurando ao ofendido direito de resposta (artigo 5º, V, CF) e a indenização pelo dano material ou moral decorrente. O ECA, seguindo essa orientação, tratou de disposição que procura demonstrar o direito que tem o menor em não ver a sua imagem explorada de qualquer forma, como exemplos:, em campanhas publicitárias, programas políticos ou espetáculos públicos, e por qualquer meio, ou seja, fotografias, filmes etc.
Veja também os artigos 143, 144 e 247, ECA, e artigo 5º, LX, CF.



Dependendo do abuso praticado, é possível a caracterização de um dos crimes contra a honra previstos no Código Penal (artigos 138 a 140).


3.3.3. Direito à preservação da identidade:
O direito de proteção da identidade também vem salvaguardado na Constituição em seu artigo 5º, X, nas expressões intimidade (relações humanas íntimas, trato com familiares e amigos) e vida privada (todas as demais relações sociais, de comércio, trabalho, estudo, lazer etc.). Ao resguardar o direito à identidade, o Estatuto evita que dados pessoais de identificação e qualificação possam ser divulgados sem o expresso consentimento dos pais ou responsável legal do menor.


3.3.4. Direito à preservação da autonomia:
Ao ordenar respeito ao direito do menor de agir segundo suas próprias decisões, pretendeu o Estatuto conceder à criança e ao adolescente a possibilidade de desenvolver sua própria personalidade. Essa autonomia há de ser entendida com restrições, uma vez que a criança e o adolescente estão sujeitos ao poder familiar ou a outro similar (como a tutela).


3.3.5. Direito à preservação de valores, idéias e crenças:
O direito à preservação de valores, idéias e crenças é corolário das demais garantias e tem por objetivo permitir a sólida formação da personalidade.



3.3.6. Direito à preservação dos espaços e objetos pessoais:
O homem precisa de espaço para viver, ver respeitados sua casa, intimidade, lembranças, patrimônio. Sem um mínimo de dignidade e respeito, não há desenvolvimento humano possível.
Mesmo o infrator, que sofre as conseqüências de sua própria conduta, tem direito de ver preservada a sua intimidade. Nesse sentido, o artigo 124, XV, que permite ao adolescente privado de liberdade a posse dos objetos pessoais e a designação de local seguro para guardá-los.


3.4. Dever da Sociedade:
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
A disposição explicita que o combate aos abusos cometidos contra menores é um dever da sociedade como um todo, na mesma linha do artigo 70, ECA. É importante acrescentar que a omissão pura e simples diante de ofensa aos direitos do menor não acarreta nenhuma sanção, salvo se o omissor tiver o dever jurídico de agir.


É o caso, por exemplo, dos médicos (artigo 13, ECA), professores e dirigentes de estabelecimentos de ensino (artigo 56, I, ECA), que devem comunicar ao Conselho Tutelar os casos de maus-tratos envolvendo seus pacientes e alunos, respectivamente. Em não o fazendo, podem cometer infração administrativa (artigo 245, ECA).

Capítulo 4 – Direito à Convivência Familiar e Comunitária.

4.1. Família Natural e Substituta:
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.
§ 1o Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)



§ 2o A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)


§ 3o A manutenção ou reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será esta incluída em programas de orientação e auxílio, nos termos do parágrafo único do art. 23, dos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)


Base da sociedade, a família tem especial proteção do Estado (artigo 226, CF) e nela, preferencialmente, deve ser mantido o menor.



Em sendo viável, deve-se procurar manter os vínculos da família biológica (artigo 25, ECA). A inserção em lar substituto é medida protetiva, excepcional, destinadas a crianças ou adolescentes em situação de risco (artigo 91, VIII, ECA), apenas pelo tempo necessário à readequação da família natural. A colocação em família substituta se faz mediante:


guarda;


tutela ou,


adoção.




A inserção em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade adoção (artigo 31, ECA).



Mesmo aos infratores, como forma de apressar a recuperação, é garantido o direito de permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais ou responsável, assim como o direito de comunicabilidade (artigo 124, VI e VIII, ECA). Vide também o disposto no artigo 94, V e VI, ECA.



Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum (artigo 130, ECA).


4.2. Filiação Legítima e Ilegítima:
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.



A Constituição, em seu artigo 227, § 6º, igualou as várias espécies de filiação, proibindo qualquer rótulo discriminatório. O artigo 20, ECA, é transcrição literal da determinação constitucional. Não se utilizam mais denominações que indiquem discriminação, como filho ilegítimo, incestuoso, adotivo, adulterino e outros.
ambém o Código Civil, em seu artigo 1.596, acolheu o mesmo princípio.

4.3. Poder Familiar:
Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.
A Carta Magna (artigo 226, § 5º) e, posteriormente, o Estatuto igualaram pai e mãe no munus de criar e educar os filhos.
O Código Civil substituiu a expressão pátrio poder pela denominação poder familiar (artigos 1.630 a 1.638). A Lei nº. 12.010/2009 alterou, da mesma forma, a Constituição Federal.
O poder familiar, entretanto, não é absoluto, podendo ser suspenso ou extinto (ver comentários ao artigo 24).

4.4. Deveres dos Pais:
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
O poder familiar implica um rol de direitos e deveres que têm por destinatários os filhos e que objetivam propiciar o sadio e integral desenvolvimento da pessoa humana.
Vide, ainda, o artigo 1.634, Código Civil. O não cumprimento dessas obrigações poderá importar em perda ou suspensão do poder familiar (artigo 24, ECA).

4.5. Carência de Recursos Materiais e Poder Familiar:
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. (alterado pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio.


Notável esse dispositivo, principalmente em um país extremamente pobre e miserável como o Brasil. A pobreza, por si só, não pode servir de fundamento para o pedido de suspensão ou perda do poder familiar. É possível que os próprios pais, vendo a carência material da família, venham a concordar com a colocação do filho em família substituta (artigo 166, parágrafo único, ECA).
Caso não se configurem maus-tratos ou carência extremada, a ponto de colocar em risco a integridade física e mental do menor, não há que se falar em retirada ou suspensão do poder familiar.
Vide também os artigos 101, IV, e 129, I, ECA.

4.6. Perda ou Suspensão do Poder Familiar:
Art. 24. A perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22.


O poder familiar não é absoluto, podendo ser suspenso ou extinto, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações (artigo 22).
Poderá ser suspenso em caso de abuso de sua autoridade, falta aos deveres aos pais inerentes, dilapidação dos bens dos filhos ou condenação dos pais por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão (artigo 1.637, Código Civil).
A extinção, por outro lado, pode ocorrer com e sem responsabilidade dos genitores. A extinção por responsabilidade é debitada ao genitor que castigar imoderadamente o filho, deixá-lo ao abandono, praticar atos contrários à moral e aos bons costumes ou incidir, reiteradamente, em atos que determinariam apenas a suspensão (artigos 1.635, V, e 1.368, Código Civil).


Dar-se-á a extinção, sem responsabilidade, em caso de morte dos pais ou do filho, pela emancipação, pela maioridade ou pela adoção (artigo 1.635, I a IV, Código Civil). Presentes os motivos autorizadores da perda ou suspensão, o procedimento judicial previsto nos artigos 155 a 163, ECA, pode ser iniciado, estando legitimados o Ministério Público ou qualquer interessado (artigo 155, ECA).

Capítulo 5 – Família Natural.

Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes.
Parágrafo único. Entende-se por família extensa ou ampliada aquela que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. O artigo relembra a orientação traçada pelo artigo 226, §§ 3º e 4º, da Constituição, no sentido de ampliar a definição de família para abranger, também, a união estável.

5.1. Reconhecimento Voluntário:
Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento, mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação.
Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.


O artigo 1º da Lei nº. 8.560/1992, acolhido pelo artigo 1.609, do Código Civil, revogou parcialmente o caput do artigo 26 do ECA.
Ler os artigos 1.607 a 1.617 do Código Civil (Do Reconhecimento dos Filhos).



Com a pertinência que lhe é peculiar, Paulo Afonso Garrido de Paula observa que o disposto no artigo 1.611, CC, beira a desonra. Prioriza o legislador o casamento, colocando em posição secundária a criança que tem o direito de ser criada pelos seus pais, reduzindo drasticamente a eficácia do princípio constitucional da maternidade/paternidade (artigo 226, § 7º, CF). A prevalência da vontade do cônjuge representa bem maior do que a convivência entre pais e filhos, do que o direito da criança a uma família. Em tese, o dispositivo permite que uma criança se crie e se eduque em uma entidade de abrigo, experenciando as agruras de uma casa de internação coletiva, em razão da recusa do cônjuge de seu pai ou mãe.


Para o mesmo autor, a segunda parte do artigo 1.616, CC, também é incompatível com a doutrina da proteção integral, porque a afetividade como valor incomensurável do desenvolvimento humano não fica sob análise da autoridade judiciária. O juiz pode reconhecer, no caso concreto, que a convivência não é possível ou adequada, mas não tem o poder de ordenar que o filho se crie e eduque fora da companhia dos pais.

5.2. Natureza do Reconhecimento do Estado de Filiação:
Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.

Este dispositivo foi derrogado pela Lei nº. 8.560/1992 (artigo 2º, §§ 4º e 5º), na parte em que imprime caráter de direito personalíssimo ao reconhecimento do estado de filiação, porque o Ministério Público passou a ter legitimidade para ajuizar a ação de investigação de paternidade.
O Código Civil prescreveu que a ação em análise compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz, acrescentando que, uma vez iniciada a ação pelo filho, seus herdeiros poderão continuá-la salvo se julgado extinto o processo (artigo 1.606, CC).
Destarte, pelo exposto no Código Civil, não é direito personalíssimo. É direito indisponível e imprescritível em razão do interesse público que contém, não sendo possível a renúncia ou a transação, podendo a ação ser aforada a qualquer tempo.

Súmula nº. 149, STF: “A Ação de Investigação de Paternidade é imprescritível, a de Petição de Herança não o é”.


A ação pode ser proposta independentemente do estado civil dos genitores ou de eventual grau de parentesco entre eles, sempre em face dos supostos pais ou, se falecidos, contra seus herdeiros.


Por não se enquadrar nas hipóteses descritas no artigo 208 do ECA, a ação não é de competência da Vara da Infância e da Juventude. A competência será da Vara Especializada de Família e Sucessões ou, à sua falta, da Vara Cível, devendo ser ajuizada no foro do domicílio do réu (artigo 94, CPC) ou, quando cumulada com alimentos, no foro do domicílio ou residência do autor (artigo 100, II, CPC, e Súmula nº. 1, STJ).
O processo deve correr em segredo de justiça (artigos 155, II, e 444, CPC).

Capítulo 6 – Da Família Substituta.

Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei.
§ 1o Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente ouvido por equipe interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente considerada.

§ 2o Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência.

§ 3o Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, a fim de evitar ou minorar as consequências decorrentes da medida.

§ 4o Os grupos de irmãos serão colocados em guarda, tutela ou adoção pela mesma família substituta, ressalvada a comprovada existência de risco de abuso ou outra situação que justifique plenamente a excepcionalidade de solução diversa, procurando-se, em qualquer caso, evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5o A colocação da criança ou adolescente em família substituta será precedida de sua preparação gradativa e acompanhamento posterior, realizados pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com o apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 6o Em se tratando de criança ou adolescente indígena ou proveniente de comunidade remanescente de quilombo, é ainda obrigatório: (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - que sejam consideradas e respeitadas sua identidade social e cultural, os seus costumes e tradições, bem como suas instituições, desde que não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais reconhecidos por esta Lei e pela Constituição Federal;

II - que a colocação familiar ocorra prioritariamente no seio de sua comunidade ou junto a membros da mesma etnia;


III - a intervenção e oitiva de representantes do órgão federal responsável pela política indigenista, no caso de crianças e adolescentes indígenas, e de antropólogos, perante a equipe interprofissional ou multidisciplinar que irá acompanhar o caso.


Como vimos, deve-se procurar manter os vínculos da família natural (artigo 25, ECA). Em alguns casos, contudo, existe a necessidade de colocação em lar substituto, como medida protetiva à criança ou adolescente em situação de risco (artigo 91, VIII, ECA). A colocação em família substituta pode ocorrer por guarda, tutela ou adoção. Nesses casos, o Estatuto acolheu a teoria da paternidade social, reconhecendo ao lar alternativo o mesmo patamar da família natural.

A competência para conhecer os pedidos de adoção é sempre da Vara da Infância e da Juventude (artigo 148, III, ECA). Os procedimentos da guarda ou da tutela somente serão processados perante a especializada se o menor estiver em situação de risco (artigos 98 e 148, parágrafo único, a, ECA), caso contrário, a atribuição desloca-se para a Vara de Família e Sucessões.

Ao escolher a família substituta, o magistrado deve atender a uma escala de prioridades:

1ª) devem-se preferir os parentes mais próximos;

2ª) inexistindo os primeiros ou sendo eles incompatíveis, devem-se buscar pessoas com mais afinidade; e

3ª) na ausência dos dois primeiros grupos, podem-se buscar outros para assumir a responsabilidade legal.
O procedimento para a colocação do menor em família substituta encontra-se regulado pelos artigos 165 a 170, ECA.


AKI 6.1. Vedações à colocação em Família Substituta:
Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado.
O artigo apenas explicita que o juiz deve sempre procurar o ambiente mais propício ao sadio desenvolvimento de crianças e adolescentes (artigos 19, 43 e 50, § 2º, ECA).
As incompatibilidades podem ser de qualquer natureza, econômica, moral, comportamental, social etc. A avaliação deve ser baseada em estudo social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional (artigo 167, ECA).
6.2. Indelegabilidade:
Art. 30. A colocação em família substituta não admitirá transferência da criança ou adolescente a terceiros ou a entidades governamentais ou não-governamentais, sem autorização judicial.
As obrigações decorrentes da adoção, guarda ou tutela são indelegáveis. A guarda e a tutela, por outro lado, são renunciáveis, ou seja, sempre que o guardião ou o tutor não pretender mais exercer as suas obrigações, poderá ingressar com um pedido judicial a fim de exonerar-se do encargo assumido.
O dispositivo veda a transferência dos menores para pessoas físicas ou jurídicas, governamentais ou não.
Mônaco da Silva afirma que não viola o preceito o guardião ou o tutor que entrega o pupilo aos pais. A exceção deve ser admitida com cautela, porque há situações em que o retorno aos pais biológicos pode ser extremamente perigoso.
O descumprimento doloso ou culposo dos deveres inerentes ao poder familiar, decorrentes da tutela ou guarda, bem como de determinação judicial ou do Conselho Tutelar, é infração administrativa (artigo 249, ECA).
Dependendo da conduta, a família substituta pode incorrer em um dos crimes contra a assistência familiar (artigos 244 a 247, ECA).
6.3. Medida Excepcional:
Art. 31. A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção.
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança estabelece, em seu artigo 21, b, que “os Estados Partes que reconhecem ou permitem o sistema de adoção atentarão para o fato de que a consideração primordial seja o interesse maior da criança. A adoção efetuada em outro país é considerada como meio de cuidar da criança, no caso em que a mesma não possa ser colocada em um lar de adoção ou entregue a uma família adotiva ou não logre atendimento adequado no seu país de origem”.
Veja, ainda, o disposto no artigo 5º, caput, CF.
6.4. Compromisso do Guardião e do Tutor:
Art. 32. Ao assumir a guarda ou a tutela, o responsável prestará compromisso de bem e fielmente desempenhar o encargo, mediante termo nos autos.
O dispositivo estende à guarda o compromisso previsto pelo artigo 1.187, CPC.

Capítulo 7 – Da Guarda.

Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. (Vide Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários.
§ 4o Salvo expressa e fundamentada determinação em contrário, da autoridade judiciária competente, ou quando a medida for aplicada em preparação para adoção, o deferimento da guarda de criança ou adolescente a terceiros não impede o exercício do direito de visitas pelos pais, assim como o dever de prestar alimentos, que serão objeto de regulamentação específica, a pedido do interessado ou do Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
A guarda é uma das formas de colocação do menor em família substituta e atribui ao guardião a tarefa indelegável de prestar assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente na qualidade de responsável legal.
É concedida sempre que os genitores biológicos não apresentarem condições, ainda que temporariamente, de exercer na plenitude o poder familiar.
A competência, na hipótese de o menor encontrar-se em situação de risco ou abandono (artigo 98, ECA), é da Vara da Infância e da Juventude; nos demais casos, da de Família e Sucessões ou, na ausência, da Vara Cível a qual for atribuída a função pela lei de organização judiciária.
As obrigações do guardião perduram até que o menor atinja a maioridade civil, aos 18 anos de idade, de acordo com o artigo 5º do Código Civil.
7.1. Disposições do Código Civil quanto à guarda dos filhos – Guarda Unilateral e Compartilhada:
O Código Civil tratou da guarda nos artigos 1.583 a 1.590, cuja leitura é recomendável.
Como vimos, sempre que o menor não estiver em situação de risco ou abandono, a competência será deslocada para a Vara de Família ou Sucessões, aplicando-se, por conseqüência, as regras do Código Civil.
A vigência do Código Civil, entretanto, só pode ser afirmada se compatível com o sistema de proteção integral adotado pelo ECA.
A Lei nº. 11.698/2008 modificou os artigos 1.583 e 1.584, CC, para estabelecer, ao lado da guarda unilateral, a possibilidade da guarda compartilhada.
Compreende-se por guarda unilateral (exclusiva ou monoparental) aquela atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua e, por guarda compartilhada ou compartida, o exercício de direitos e deveres e a responsabilização conjunta do pai e da mãe que não mais vivem sob o mesmo teto, no que toca ao poder familiar dos filhos comuns.
Fernanda Levy estabelece uma distinção entre guarda comum, conjunta ou indistinta, e guarda compartilhada ou compartida. A primeira é aquela exercida indistintamente por ambos os genitores durante a vigência da sociedade conjugal, enquanto que a segunda pressupõe a falta de vínculo conjugal dos pais e uma co-responsabilidade no exercício das funções parentais.
7.1.1. Guarda Consensual:
De acordo com o artigo 1.584, I, CC, a guarda unilateral ou compartilhada pode ser requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida cautelar.
Observa-se que o legislador civilista adotou o princípio da autonomia da vontade, em que o acordo celebrado entre os pais resolve a questão da guarda, esquecendo-se da opinião do menor.
O artigo 28, § 1º, ECA, prevê que a criança e o adolescente, em sendo possível, precisam ser previamente ouvidos e as suas opiniões devidamente consideradas.
7.1.2. Guarda Não Consensual:
Se não houver acordo entre os pais e sendo possível, o magistrado deve preferir a modalidade compartilhada (artigo 1.584, § 2º, CC).
Não sendo possível ou recomendável a fixação da guarda compartilhada, o juiz deve atentar para as necessidades específicas do filho (artigo 1.584, II, CC) e deferir a guarda unilateral ao genitor que revele melhores condições para exercê-la (artigo 1.583, § 2º, CC).
Se perceber que o menor não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, o magistrado pode deferi-la a terceira pessoa, que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade (artigo 1.584, § 5º, CC).
Todas as medidas decretadas incidentalmente na separação ou divórcio têm cunho eminentemente cautelar, e necessitam de regulamentação posterior no juízo da infância e da juventude, único com competência para a colocação definitiva em família substituta.
7.1.3. Regras da Guarda Compartilhada:
Havendo fixação da guarda compartilhada, na audiência de conciliação, o juiz deve informar os genitores sobre o significado do regime adotado, especialmente em relação aos direitos e deveres e às sanções a que estão sujeitos em caso de descumprimento das condições impostas (artigo 1.584, § 1º, CC). Veja, também, o § 3º do mesmo artigo.
Ensina Garrido de Paula: “Divisão de espaços, de rotinas, de autoridades, de convivência, da unidade dos exemplos como modelos de conduta para o ser em formação, são algumas das preocupações que devem ser sopesadas pelo julgador, de sorte que a partilha dos filhos não seja repartição de pessoas”.
7.1.4. Sanções pelo descumprimento (artigo 1.584, § 4º, CC).
7.1.5. Guarda Alternada:
Fernanda Levy aponta, ainda, a guarda alternada, caracterizada pela permanência dos filhos com os pais em períodos alternados, de modo que, nos intervalos estipulados, os genitores revezem os direitos de guarda e visita reciprocamente.
7.1.6. Novas núpcias (artigo 1.588, CC).
7.1.7. Direito de visita (artigo 1.589, CC).
7.2. Espécies de Guarda previstas pelo ECA:
A guarda pode ser de fato, quando o menor simplesmente foi acolhido por terceiros, sem determinação judicial, e de direito, que se subdivide em provisória (artigo 33, § 1º), permanente (artigo 33, § 2º), previdenciária (artigo 33, § 3º) e especial (artigo 34).
7.3. Guarda Provisória:
Tem lugar nos processos de tutela ou adoção e visa regular uma situação de fato até que a decisão seja proferida pela Justiça, podendo ser decretada, portanto, liminar ou incidentalmente.
Pode ser decretada, inclusive, em casos em que o menor não se encontra de fato com os guardiães, mas em situação de risco, que reclama urgente afastamento da família natural.
7.4. Guarda Permanente:
A guarda é instituto de caráter provisório, medida preparatória para a concessão de tutela ou adoção. Algumas situações excepcionais, porém, reclamam uma medida permanente.
Para isso, previu o legislador, no § 2º do artigo 33, que, fora dos casos de tutela e adoção, a guarda pode ser concedida para atender a situações peculiares, ou suprir a falta dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
Embora vigore por prazo indeterminado, não assume caráter definitivo, podendo a medida ser revogada a qualquer tempo (artigo 35, ECA).
7.5. Guarda Previdenciária:
Esta modalidade era utilizada nos casos em que, não havendo a guarda de fato, pudesse o menor ser inserido como dependente, unicamente para fins previdenciários e visando receber os benefícios desta condição.
Modernamente, não há que se falar em dependência para fins previdenciários sem que preexista a guarda de fato. O legislador afirmou que a condição de dependente previdenciário é decorrência da guarda e jamais o inverso (artigo 33, § 3º).
7.6. Guarda à Pessoa Jurídica:
De acordo com alguns doutrinadores, a guarda pode ser concedida provisoriamente a uma pessoa jurídica, desde que atue na área social de abrigo a crianças e adolescentes abandonados.
7.7. Guarda Especial:
Art. 34. O poder público estimulará, por meio de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, o acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente afastado do convívio familiar. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o A inclusão da criança ou adolescente em programas de acolhimento familiar terá preferência a seu acolhimento institucional, observado, em qualquer caso, o caráter temporário e excepcional da medida, nos termos desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o Na hipótese do § 1o deste artigo a pessoa ou casal cadastrado no programa de acolhimento familiar poderá receber a criança ou adolescente mediante guarda, observado o disposto nos arts. 28 a 33 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
O artigo visa estimular o acolhimento de crianças e adolescentes de difícil colocação, excluídos da tutela e da adoção por ausência de interessados.
Sobre o assunto, veja, ainda, o artigo 260, ECA.
7.8. Revogação e Alteração da Guarda:
Art. 35. A guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público.
Ao contrário da tutela ou adoção, que colocam o menor sob responsabilidade definitiva do tutor ou adotante, a guarda pode ser revogada a qualquer momento por decisão interlocutória ou sentença (artigo 162, §§ 1º e 2º, CPC).
Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelo guardião, o juiz pode determinar o afastamento cautelar do agressor da moradia comum, revogando a guarda (artigo 130, ECA).

Capítulo 8 – Da Tutela.
Art. 36. A tutela será deferida, nos termos da lei civil, a pessoa de até 18 (dezoito) anos incompletos. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. O deferimento da tutela pressupõe a prévia decretação da perda ou suspensão do poder familiar e implica necessariamente o dever de guarda. (Alterado pela Lei nº 12.010, de 2009)
A tutela é uma das formas definitivas de colocação do menor em família substituta.
O objetivo da tutela é a concessão, em caráter definitivo, do dever de assistência ao menor de 18 (dezoito) anos, que não esteja sob o poder familiar e nem mesmo esteja, nos termos da lei civil, emancipado.
Trata-se de imposição do Estado com a finalidade de garantir o pleno desenvolvimento da criança e do adolescente, além do correto gerenciamento de seus bens. Serve, também, para que irmãos ou avós possam ser representantes do menor, já que a lei, nestes casos, veda a adoção pela proximidade sanguínea.
8.1. Hipóteses de Concessão da Tutela:
A tutela pode ser concedida aos filhos menores (artigo 1.728, CC): a) com o falecimento dos pais, ou sendo estes julgados ausentes; e b) em caso de os pais decaírem do poder familiar.
Garrido de Paula sustenta que pode haver contradição aparente entre o artigo 36, parágrafo único, ECA, e o artigo 1.728, II, CC. Poder-se-ia considerar que com o advento do novo Código Civil não é mais possível deferir a tutela com fulcro apenas na suspensão do pátrio poder. Todavia, ainda prevalece a autorização contida no Estatuto, mesmo porque tal conclusão também está respaldada pelo sistema adotado pelo próprio Código Civil.
8.2. Idade Máxima:
Com a alteração da maioridade civil para os 18 (dezoito) anos, somente poderá ser concedida até esta idade (artigo 5º, CC).
8.3. Funções do Tutor:
As inúmeras funções do tutor estão especificadas nos artigos 1.740 a 1.752, CC.
8.4. Espécies de Tutela:
A tutela pode ser:
a) Testamentária: quando os pais exprimem sua vontade por testamente ou outro documento autêntico (artigo 1.729, CC), sendo nula a nomeação de tutor pelo pai ou pela mãe que, ao tempo de sua morte, não tinha o poder familiar (artigo 1.730, CC).
b) Legítima: à falta de testamento, a tutela é incumbida aos parentes próximos (artigo 1.731, CC).
c) Dativa: na ausência de tutor testamentário, ou legítimo, quando estes forem excluídos ou escusados da tutela ou, ainda, quando forem removidos por não idôneos.
Aos irmãos órfãos dar-se-á um único tutor. Se no testamento tiver sido nomeado mais de um tutor sem indicação de precedência, a tutela deve ser cometida ao primeiro, e os outros lhe sucederão por ordem de nomeação (artigo 1.733, caput e § 1º, CC).
Observe também a redação do artigo 1.734, CC.
8.5. Curador Especial (artigo 1.733, § 2º, CC).
8.6. Quem pode ser tutor:
Na falta de tutor nomeado pelos pais (sucessão legítima), a tutela incumbe aos parentes consangüíneos na ordem expressa no artigo 1.731, CC.
A ordem não é absoluta, pois o juiz pode escolher, entre eles, o mais apto para exercer o encargo (artigo 1.731, II, in fine).
Na tutela dativa (artigo 1.732, CC), o juiz nomeará tutor idôneo e residente no domicílio do menor.
8.7. Causas de impedimento ao exercício da tutela (artigo 1.735, CC).
8.8. Escusa da Tutela:
O nomeado não pode eximir-se do encargo, salvo se não for parente do menor e houver familiar idôneo, consangüíneo ou afim, em condições de exercer a tutela (artigo 1.737, CC).
O artigo 1.736, CC, apresenta aqueles que podem escusar-se da tutela.
Em caso de escusa, as razões devem ser apresentadas nos dez dias subseqüentes à designação (por óbvio, o prazo somente começará a fluir com a intimação), sob pena de perder o direito de alegá-la. Caso o motivo impeditivo surja apenas depois da aceitação, o nomeado terá idêntico prazo de dez dias, contados da data em que a causa impeditiva sobreveio (artigo 1.738, CC).
Se a escusa não for aceita pelo magistrado, a função deve ser assumida, enquanto eventual recurso interposto não tiver provimento, respondendo o nomeado por eventuais perdas e danos que o menor possa sofrer (artigo 1.739, CC).
8.9. Sucessão na Tutela:
A tutela não implica direito sucessório, ou seja, falecendo o tutor o tutelado não integrará o rol de herdeiros.
8.10. Cessação da Tutela:
As hipóteses de cessação da condição de tutelado estão previstas no artigo 1.763, CC, enquanto que os casos de cessação da função de tutor estão dispostos no artigo 1.764, CC.
8.11. Duração da Tutela:
Prazo de 2 (dois) anos, podendo ocorrer prorrogação se o tutor desejar, com a aquiescência do juiz, que deverá analisar a conveniência para o menor (artigo 1.765, CC).
8.12. Garantia da Tutela:
Art. 37. O tutor nomeado por testamento ou qualquer documento autêntico, conforme previsto no parágrafo único do art. 1.729 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil, deverá, no prazo de 30 (trinta) dias após a abertura da sucessão, ingressar com pedido destinado ao controle judicial do ato, observando o procedimento previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. Na apreciação do pedido, serão observados os requisitos previstos nos arts. 28 e 29 desta Lei, somente sendo deferida a tutela à pessoa indicada na disposição de última vontade, se restar comprovado que a medida é vantajosa ao tutelando e que não existe outra pessoa em melhores condições de assumi-la. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
8.13. Destituição da Tutela:
Art. 38. Aplica-se à destituição da tutela o disposto no art. 24.
O tutor será destituído de suas funções quando for negligente, prevaricador ou incapaz no gerenciamento da vida civil do menor (artigo 1.766, CC).
A destituição da tutela, nos termos do artigo 164, ECA, segue o procedimento previsto na legislação civil (artigos 1.194 a 1.198, CPC).

Capítulo 9 – Da Adoção.

Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei.
§ 1o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o É vedada a adoção por procuração. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Adoção é a modalidade definitiva de colocação em família substituta. Pode ter por objeto tanto os menores de 18 (dezoito) anos, como os maiores. O Estatuto regula somente a adoção de crianças e adolescentes, deixando para a lei civil a regulamentação dos que já atingiram a maioridade.
Muito embora o Código Civil tenha tratado da matéria (artigos 1.618 a 1.629), não determinou a revogação dos dispositivos do Estatuto, que continua vigendo para os menores de 18 (dezoito) anos em caráter de coexistência e complementariedade, lembrando que a coexistência somente é possível se não existir conflito entre os dispositivos.
A adoção é medida irrevogável, nem mesmo com a morte dos adotantes o vínculo da família biológica é restabelecido (artigo 49, ECA).
O Código Civil não prevê nenhuma hipótese de revogação da adoção, todavia, as causas de deserção, aplicáveis aos filhos naturais, também podem ser impostas aos filhos adotivos (artigos 1.814 e 1.962, CC).
Sendo a adoção um ato jurídico, pode apresentar nulidades absolutas ou relativas, podendo, ainda, ser aforadas ações rescisórias (artigo 485, CPC) ou anulatórias (artigo 486, CPC).
9.1. Espécies de Adoção:
O Estatuto prevê uma única forma, denominada simplesmente de adoção, simplificando e facilitando a colocação dos menores que necessitam de amparo familiar.
9.2. Definição e Natureza Jurídica:
Afirma Sílvio Venosa: “Adoção é modalidade artificial de filiação que busca imitar a filiação natural, bem por isso conhecida como filiação civil, porquanto decorre não de uma relação biológica, mas de uma relação exclusivamente civil e jurídica. A adoção é, portanto, um ato ou negócio jurídico que cria relações de paternidade e filiação entre duas pessoas”.
Pelo conceito, fica claro que a adoção tem natureza jurídica de ato ou negócio jurídico, e não meramente contratual.
Segundo tradicional corrente francesa, em sendo o caso de adotando maior de 18 (dezoito) anos, trata-se de ato de natureza contratual, bilateral e solene, pelo qual, presentes os requisitos legais, o adotante estabelece com o adotado um vínculo fictício de paternidade e filiação legítima, de efeito ilimitado e com total desligamento do adotado de sua família de sangue.
Sendo, porém, o caso de adotando menor de 18 (dezoito) anos, não se pode falar em contrato, uma vez que não se pode considerar somente a existência de simples bilateralidade na manifestação de vontade, porque o Estado participa necessária e ativamente do ato, exigindo-se uma sentença judicial. Desse modo, aqui há ato jurídico com marcante interesse público que afasta a noção contratual.
9.3. Adoção Civil, Comum, Simples ou Restrita:
Prevista nos artigos 368 a 378 do Código Civil de 1916. Com a nova sistemática adotada pelo Código Civil vigente essa modalidade de adoção foi extinta.
9.4. Adoção por Procuração:
O parágrafo segundo do artigo 39 veda a adoção por procuração.
9.5. Intervenção de Advogado:
Não havendo contraditório, é dispensável a intervenção de advogado, podendo o pedido ser feito em cartório.
Em havendo contestação, é necessária a intervenção de procurador, salvo se ação for proposta pelo Ministério Público.
Veja o disposto no artigo 166, caput, ECA.
9.6. Intervenção do Ministério Público:
A falta de manifestação do promotor de justiça leva à nulidade absoluta do feito. A intervenção ministerial, entretanto, resume-se ao mérito da demanda.
9.7. Juízo Competente:
Sendo o adotando menor de 18 (dezoito) anos, a competência para conhecer do processo de adoção é da Vara da Infância e da Juventude. Se maior, a competência passa para a Vara de Família e Sucessões. Para se verificar qual o juízo competente, tem que se observar a idade do adotando à data do pedido de adoção.
O foro para ajuizamento da ação é o do domicílio ou residência do adotando.
Deferido o pedido, o juiz determinará a expedição de mandado para cancelamento do registro primitivo e lavratura de um novo.
9.8. Idade do Adotando:
Art. 40. O adotando deve contar com, no máximo, dezoito anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes.
9.9. Condições da Adoção:
Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais.
O dispositivo busca explicitar o princípio da isonomia dos filhos (artigo 227, § 6º, CF), segundo o qual a lei não estabelece qualquer diferença entre a filiação natural e a adotiva.
9.10. Adoção Unilateral:
§ 1º Se um dos cônjuges ou concubinos adota o filho do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante e os respectivos parentes.
O § 1º do artigo 41 contempla a adoção unilateral, hipótese em que um dos cônjuges ou concubinos adota o filho natural do outro, ocorrendo a substituição da filiação apenas na linha paterna ou materna.
Ao utilizar o termo concubinos, o legislador referiu-se à união estável entre o homem e a mulher (artigo 226, § 3º, CF, e Lei nº. 9.278/1996).
A adoção unilateral pode acontecer em quatro situações: 1ª) um dos pais é desconhecido; 2ª) houve perda do poder familiar por parte de um dos genitores biológicos em razão dos descumprimentos dos deveres inerentes; 3ª) embora ambos os genitores biológicos tenham reconhecido o menor, um deles concorda expressamente com o pedido; e, 4ª) morte do pai ou mãe do adotando.
Não obstante as divergências existentes com relação à aceitação da última hipótese, a legislação vigente não reconhece impedimento à adoção unilateral no caso. Extinto o poder familiar do genitor falecido, o menor pode ser adotado livremente, bastando a aquiescência do sobrevivente.
Em todas as hipóteses de adoção unilateral, o magistrado deve deferir o pedido apenas se ficar plenamente demonstrado que a solução trará benefícios para o menor.
9.11. Direito Sucessório:
§ 2º É recíproco o direito sucessório entre o adotado, seus descendentes, o adotante, seus ascendentes, descendentes e colaterais até o 4º grau, observada a ordem de vocação hereditária.
O filho adotivo se equipara totalmente ao filho natural, inclusive em relação à sucessão (artigo 1.829, CC).
Se a morte do genitor biológico ocorreu antes do trânsito em julgado da sentença que deferiu o pedido de adoção, o adotado tem direito à sucessão de seu pai natural.
9.12. Requisitos para a Adoção e Ausência de Parentesco Próximo:
Art. 42. Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.
§ 2o Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Os requisitos são exigíveis para os adotantes nacionais e para os estrangeiros não residentes no Brasil.
Não podem adotar os ascendentes (avós) e os irmãos do adotando. Como exceção, a jurisprudência tem entendido que os avós por afinidade podem adotar, não incidindo o impedimento do artigo 42, § 1º, ECA.
Não há nenhuma vedação em relação à adoção por colaterais de terceiro e quarto graus, nada impedindo que alguém adote um sobrinho ou um primo. Na apreciação do pedido, o juiz deve levar em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade.
9.13. Estado Civil do Adotante:
A adoção independe do estado civil do adotante, ou seja, podem adotar o casado, o solteiro, o viúvo, o divorciado e o concubino.
9.14. Idade Mínima do Adotante:
Consoante o artigo 1.618, caput, do Código Civil, a idade mínima do adotante é de 18 (dezoito) anos. Além disso, de acordo com o parágrafo único do mesmo artigo, basta que um dos cônjuges ou conviventes seja maior de idade para que ambos possam adotar, ainda que o outro seja menor.
O limite de idade do adotante caiu sistematicamente na legislação (de 21 para 18 anos). Muito embora essa redução busque facilitar a adoção, a pouca idade do adotante pode não ser recomendável ao adotando, quer pela ausência de estabilidade econômica, emocional e amadurecimento pessoal.
9.15. Diferença de Idade entre Adotante e Adotado:
§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.
No mesmo sentido, o artigo 1.619, CC.
Se a adoção for pleiteada por casal (casados ou não), deve-se entender possível a adoção quando apenas um dos cônjuges ou concubinos apresenta a diferença preceituada.
Por outro lado, o Estatuto não previu uma diferença máxima de idade entre adotante e adotado, nada impedindo, em tese, que uma pessoa de 80 (oitenta) anos adote um recém-nascido. Na prática, essa diferença extrema não é recomendável, pois o objetivo da adoção é o de inserir o menor em uma família substituta que se assemelhe ao máximo à natural.
9.16. Adoção por Casal Divorciado ou Separado:
§ 4o Os divorciados, os judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5o Nos casos do § 4o deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
No mesmo sentido, o artigo 1.622, parágrafo único, do Código Civil.
Não obstante a recomendação do dispositivo, se a adoção for conveniente para o menor, poderá ser concedida pelo magistrado, mesmo sem acordo com relação ao direito de visita e guarda, que podem ser fixadas judicialmente.
9.17. Adoção por Concubinos:
Possível, desde que comprovada a estabilidade da relação. O artigo 42, § 2º, refere-se expressamente a essa possibilidade.
9.18. Adoção por Casais Homossexuais:
O Código Civil, aplicável às adoções regidas pelo ECA, estabelece que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável (artigo 1.622, CC). O dispositivo encontra amparo no artigo 226, § 3º, da Constituição.
Analisando-se o frio texto da legislação atual, um casal homossexual não pode adotar um menor. Existe, entretanto, uma forte tendência de se admitir a existência de um gênero de união estável que comporta duas espécies: a união estável heteroafetiva e a união estável homoafetiva, devendo ambas ser abrangidas pelo conceito de entidade familiar.
Nesse sentido, o ensinamento de Maria Berenice Dias: “A norma (artigo 226 da Constituição) é uma cláusula geral de inclusão, não sendo admissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos de afetividade, estabilidade e ostensividade. Não se pode deixar de reconhecer que há relacionamentos que, mesmo sem a diversidade de sexos, atendem tais requisitos. Têm origem em um vínculo afetivo, devendo ser identificados como entidade familiar a merecer a tutela legal”.
De se observar, em acréscimo, que a adoção por homossexual, individualmente, já vem sendo admitida há algum tempo, precedida de cuidadoso estudo psicossocial por equipe interdisciplinar.
Por fim, pesa ainda em favor da possibilidade de adoção por casal homossexual a necessidade de se resguardarem os direitos sucessórios do menor em relação a ambos os pais e não somente a um deles, muito embora algumas questões práticas, como a inscrição no registro de nascimento, ainda não tenham encontrado solução razoável.
Sendo assim, em vista da mudança favorável na orientação jurisprudencial, é necessário buscar, com urgência, alteração legislativa para regulamentação do instituto.
9.19. Adoção Post Mortem, Nuncupativa ou Póstuma:
§ 6o A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Embora alguns autores entendam que o dispositivo somente é aplicável se o falecido ingressou efetivamente com o pedido de adoção, a jurisprudência vem mitigando essa posição para estender os efeitos a qualquer procedimento de colocação em família substituta (guarda ou tutela).
9.20. Critérios para a Adoção:
Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.
Ao decidir pela concessão do pedido, o juiz deve atentar primordialmente para o bem-estar do menor. Por meio de relatórios sociais e psicológicos (artigo 168, ECA), a análise deve ser ampla, abrangendo o aspecto sócio-econômico, o ambiente e a estrutura familiar, condições de higiene e outros.
Em um segundo momento, o juiz deve perquirir as razões do pedido, rechaçando os motivos mesquinhos e torpes.
O novo diploma civil não mencionou expressamente o motivo da adoção como requisito para o deferimento do pedido (vide artigo 1.625, CC), mas parece óbvio que o magistrado não poderá considerar profícua uma adoção movida por razões ilegítimas.
9.21. Exigência de Prestação de Contas:
Art. 44. Enquanto não der conta de sua administração e saldar o seu alcance, não pode o tutor ou o curador adotar o pupilo ou o curatelado.
Os tutores e os curadores podem adotar seus pupilos e curatelados. Para tanto, é imprescindível que prestem contas de sua administração (artigo 1.620, CC).
Sendo um requisito objetivo, a prova da efetiva prestação de contas deve instruir a petição inicial do pedido de adoção (artigo 165, V, ECA).
9.22. Consentimento dos Pais, Tutor ou Curador:
Art. 45. A adoção depende do consentimento dos pais ou do representante legal do adotando.
O consentimento deve ser formal, proferido na presença da autoridade judiciária e do Ministério Público, tomando-se por termo as declarações (artigo 166, parágrafo único, ECA).
Quando os pais biológicos do adotando forem menores de 18 anos, só poderão ofertar o consentimento se assistidos por seus representantes legais ou curador nomeado pelo juiz. Se portadores de deficiência mental, não poderão consentir, sendo necessário procedimento para a destituição do poder familiar, com a nomeação de curador especial.
O artigo 1.621, § 2º, CC, complementa o artigo 45, ECA.
9.23. Dispensa do Consentimento:
§ 1º. O consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar. (Alterado pela Lei nº 12.010, de 2009)
O Código Civil, ao ampliar significativamente as causas de dispensa do consentimento, revogou tacitamente o § 1º do artigo 45 do Estatuto. Portanto, as hipóteses estão previstas no artigo 1.624, CC.
O juiz deve ter extrema cautela ao dispensar o consentimento com base na alegação de desaparecimento dos pais biológicos. Recomendam-se a citação por edital, a expedição de ofícios e outras diligências na tentativa de localização do paradeiro dos genitores.
Por fim, note-se que a mera suspensão do poder familiar não permite o deferimento da adoção, que reclama a destituição ou o consentimento.
Segundo Garrido de Paula: “Negado o consentimento ou não sendo obtida a adesão dos pais, mister é a destituição do poder familiar, em processo contraditório, assegurada a ampla defesa aos pais”. Para Eduardo Roberto Alcântara Del-Campo e Thales Cezar de Oliveira: “Não há necessidade de procedimento autônomo, bastando que se assegure, no processo de adoção, a observância ao princípio do contraditório, uma vez que a perda do poder familiar constitui pressuposto lógico do pedido”.
9.24. Consentimento Unilateral:
Como regra, o consentimento deve ser dado por ambos os pais biológicos. Por exceção, há julgados que admitem apenas o consentimento do genitor que exerce com exclusividade o poder familiar.
9.25. Adoção Intuitu Personae:
É aquela em que os pais dão consentimento para a adoção em relação a determinada pessoa. Como o juiz deve buscar sempre as reais vantagens para o adotando, pode concordar com o consentimento dirigido à pessoa certa e, presentes os demais requisitos legais, acolher o pedido.
9.26. Necessidade de Contraditório e Ampla Defesa:
Em havendo exercício do poder familiar, ainda que apenas formalmente, a adoção deve ser precedida do procedimento de destituição, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
“Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do poder familiar, ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes, dispensada a assistência de advogado” (artigo 166, caput, ECA).
9.27. Consentimento do Adolescente:
§ 2º. Em se tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o seu consentimento.
Trata-se de importante determinação, que vem ao encontro da orientação de entender o menor como sujeito de direitos.
A ausência de consentimento do adolescente não vincula o magistrado, que, entendendo ser profícua a adoção, pode deferi-la ainda que contra a expressa vontade do adotante.
Alguns doutrinadores entendem que, se o menor tiver menos de 12 anos, mas puder expressar sua vontade, deve ser ouvida a sua opinião (artigos 16, II, e 28, § 1º, ECA).
9.28. Estágio de Convivência:
Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso.
O estágio de convivência é um período estabelecido pelo legislador para avaliar a adaptação do adotando, durante o qual o menor permanece na companhia dos pretendentes em regime de guarda provisória (artigo 33, § 1º, ECA).
A duração da medida deve ser fixada pelo juiz de acordo com as peculiaridades de cada caso, podendo haver prorrogação, se necessário. O estágio implica, também, a necessidade de acompanhamento por equipe interprofissional (artigo 151, ECA).
9.29. Dispensa do Estágio de Convivência:
§ 1o O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que seja possível avaliar a conveniência da constituição do vínculo. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o A simples guarda de fato não autoriza, por si só, a dispensa da realização do estágio de convivência. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
9.30. Estágio de Convivência na Adoção Internacional:
§ 3o Em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de, no mínimo, 30 (trinta) dias. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
No caso de adoção internacional, o estágio é obrigatório e deve ser cumprido em território nacional.
O prazo mínimo será de 30 (trinta) dias, podendo ser ampliado a critério do juiz.
No que toca à adoção internacional, o Estatuto é muito rigoroso, posto que salvaguarda os direitos do menor, que, uma vez fora do país, não mais poderá ser tutelado pela justiça brasileira. Tanto isso é verdade que para o estrangeiro domiciliado no país a lei reserva tratamento isonômico (artigo 5º, caput, CF).
O risco de deferir uma adoção internacional sem um estágio mínimo de convivência, durante o qual o quadro pode ser revertido, é muito grande e, em nome da preservação dos direitos da criança e do adolescente, justifica o tratamento rigoroso.
9.31. Acompanhamento pela Equipe Multidisciplinar:
§ 4o O estágio de convivência será acompanhado pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política de garantia do direito à convivência familiar, que apresentarão relatório minucioso acerca da conveniência do deferimento da medida. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
9.32. Novo Registro Civil:
Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão.
§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem como o nome de seus ascendentes.
§ 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará o registro original do adotado.
§ 3o A pedido do adotante, o novo registro poderá ser lavrado no Cartório do Registro Civil do Município de sua residência. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 4o Nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar nas certidões do registro. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5o A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a pedido de qualquer deles, poderá determinar a modificação do prenome. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 6o Caso a modificação de prenome seja requerida pelo adotante, é obrigatória a oitiva do adotando, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 7o A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença constitutiva, exceto na hipótese prevista no § 6o do art. 42 desta Lei, caso em que terá força retroativa à data do óbito. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 8o O processo relativo à adoção assim como outros a ele relacionados serão mantidos em arquivo, admitindo-se seu armazenamento em microfilme ou por outros meios, garantida a sua conservação para consulta a qualquer tempo. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Ainda sobre o assunto, veja o artigo 1.626, CC.
9.33. Origem Biológica e Acesso ao Processo de Adoção:
Art. 48. O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica, bem como de obter acesso irrestrito ao processo no qual a medida foi aplicada e seus eventuais incidentes, após completar 18 (dezoito) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. O acesso ao processo de adoção poderá ser também deferido ao adotado menor de 18 (dezoito) anos, a seu pedido, assegurada orientação e assistência jurídica e psicológica. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
9.34. Adoção à Brasileira:
Sugestivo o nome dado pela doutrina para indicar a hipótese de quem pratica uma das condutas criminosas previstas no artigo 242 do Código Penal.
Na verdade, as condutas criminosas do artigo 242, CP, não configuram hipóteses de adoção, pela total ausência de atos constitutivos. Em razão disso, inaplicáveis os preceitos previstos no artigo 41 do Estatuto.
Na modalidade substituição do recém-nascido, pode também ficar caracterizado o crime previsto no artigo 229, ECA, se o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de saúde deixou de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, facilitando a troca.
9.35. Morte dos Adotantes:
Art. 49. A morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)
Uma das principais características da adoção é a sua irrevogabilidade. Nem mesmo com a morte dos adotantes a filiação biológica se restabelece. Segundo entendimento de Cury, Garrido, Marçura e Mônaco da Silva, a única forma de restabelecer o poder familiar perdido é por meio de novo procedimento de adoção.
9.36. Cadastro de Menores:
Art. 50. A autoridade judiciária (Cartório da Infância e da Juventude) manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção. (Vide Lei nº 12.010, de 2009)
Tarcísio da Costa lembra que “a medida é salutar e de largo alcance humano e social, pois a organização do cadastro de crianças e adolescentes elegíveis à adoção e de candidatos interessados, permitirá identificar, com maior rapidez e segurança, crianças e adolescentes institucionalizados, esquecidos nas entidades de amparo”.
9.37. Inscrição no Cadastro:
§ 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público.
A inscrição de pretendentes no cadastro é feita por meio de um procedimento próprio, não contencioso, em que são analisadas as peculiaridades de cada caso e verificados os requisitos exigidos pelo artigo 29, ECA.
Nesse procedimento, em que o Ministério Público deve intervir obrigatoriamente, os pretendentes são avaliados pelo Setor Técnico do Juízo (psicólogos, assistentes sociais etc.).
9.38. Indeferimento da Inscrição:
§ 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não satisfazer os requisitos legais, ou verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 29.
§ 3o A inscrição de postulantes à adoção será precedida de um período de preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 4o Sempre que possível e recomendável, a preparação referida no § 3o deste artigo incluirá o contato com crianças e adolescentes em acolhimento familiar ou institucional em condições de serem adotados, a ser realizado sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, com apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de acolhimento e pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5o Serão criados e implementados cadastros estaduais e nacional de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à adoção. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 6o Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais residentes fora do País, que somente serão consultados na inexistência de postulantes nacionais habilitados nos cadastros mencionados no § 5o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 7o As autoridades estaduais e federais em matéria de adoção terão acesso integral aos cadastros, incumbindo-lhes a troca de informações e a cooperação mútua, para melhoria do sistema. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 8o A autoridade judiciária providenciará, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a inscrição das crianças e adolescentes em condições de serem adotados que não tiveram colocação familiar na comarca de origem, e das pessoas ou casais que tiveram deferida sua habilitação à adoção nos cadastros estadual e nacional referidos no § 5o deste artigo, sob pena de responsabilidade. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 9o Compete à Autoridade Central Estadual zelar pela manutenção e correta alimentação dos cadastros, com posterior comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 10. A adoção internacional somente será deferida se, após consulta ao cadastro de pessoas ou casais habilitados à adoção, mantido pela Justiça da Infância e da Juventude na comarca, bem como aos cadastros estadual e nacional referidos no § 5o deste artigo, não for encontrado interessado com residência permanente no Brasil. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 11. Enquanto não localizada pessoa ou casal interessado em sua adoção, a criança ou o adolescente, sempre que possível e recomendável, será colocado sob guarda de família cadastrada em programa de acolhimento familiar. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 12. A alimentação do cadastro e a convocação criteriosa dos postulantes à adoção serão fiscalizadas pelo Ministério Público. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 13. Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previamente nos termos desta Lei quando: (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - se tratar de pedido de adoção unilateral; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-fé ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 14. Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o candidato deverá comprovar, no curso do procedimento, que preenche os requisitos necessários à adoção, conforme previsto nesta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Contra eventual indeferimento do pedido de habilitação, uma vez que a inscrição no cadastro de pretendentes não apresenta formalidade própria, alguns juízes da Infância e da Juventude têm aceitado simples pedidos de reconsideração fundamentados, protocolados em cartório pelos pretendentes recusados.
9.39. Ordem do Cadastro:
Como regra, a ordem de inscrição dos pretendentes deve ser obedecida. Por exceção, considerando-se que o juiz deve sempre buscar o melhor para o menor, a ordem pode, e em alguns casos deve, ser quebrada.
Segundo Carlos Eduardo Pachi: “Cabe ao juiz verificar, em seu cadastro, o pretendente que mais se adapte às necessidades do adotando, independentemente da ordem de inscrição”.
9.40. Cadastro Nacional de Adoção:
A Resolução nº. 54/2008, do Conselho Nacional de Justiça criou o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), com a finalidade de “consolidar dados de todas as comarcas das unidades da federação referentes a crianças e adolescentes disponíveis para adoção, após o trânsito em julgado dos respectivos processos, assim como dos pretendentes domiciliados no Brasil e devidamente habilitados” (artigo 1º), objetivando auxiliar os magistrados na condução dos procedimentos de adoção.
Hospedado e administrado pelo Conselho Nacional de Justiça, o banco de dados permite o acesso apenas aos juízes competentes.
Sua criação permitiu que, a partir de uma única inscrição feita na comarca de sua residência, o pretendente esteja apto a adotar em qualquer comarca ou Estado da Federação, garantindo que a adoção internacional somente seja deferida quando esgotadas as chances da nacional, pois, conforme já salientado, a adoção internacional é medida absolutamente excepcional (artigo 31, ECA).
A excepcionalidade da adoção internacional também encontra-se ratificada no artigo 4º, b, da Convenção de Haia (aprovada pelo Decreto Legislativo nº. 01/1999 e promulgada no Brasil pelo Decreto Presidencial nº. 3.087/1999).
9.40.1. Procedimento para Inscrição dos Pretendentes:
O pretendente à adoção de criança ou adolescente deve buscar habilitação na Vara da Infância e da Juventude de sua comarca ou, na inexistência de especializada, naquela com competência segundo a organização judiciária local.
Uma vez prolatada a sentença de habilitação, o juízo deve inserir os dados do pretendente no Cadastro Nacional até o 5º dia útil do mês subseqüente ao do cadastramento.
As inscrições serão válidas por 5 (cinco) anos ou lapso menor, a critério do juízo, se houver necessidade de reavaliação do pretendente. Vencido o prazo de inscrição sem que tenha ocorrido a adoção, o pretendente deve ser notificado pelo juízo para que manifeste o interesse sobre renovação do pedido.
9.40.2. Critérios de Prioridade:
Muito embora o Estatuto não aponte critérios para a convocação dos pretendentes, a ordem de inscrição deve ser obedecida salvo se houver motivo justificante baseado no interesse do menor.
Embora o Cadastro Nacional de Adoção utilize para classificação o critério da preferência da data da sentença de habilitação, fica assegurada ao juiz a discricionariedade para, dentre os habilitados, escolher o mais indicado para o caso concreto.
9.41. Adoção Internacional:
Art. 51. Considera-se adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no Artigo 2 da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo no 1, de 14 de janeiro de 1999, e promulgada pelo Decreto no 3.087, de 21 de junho de 1999. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o A adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro ou domiciliado no Brasil somente terá lugar quando restar comprovado: (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros mencionados no art. 50 desta Lei; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
III - que, em se tratando de adoção de adolescente, este foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante parecer elaborado por equipe interprofissional, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei. (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o Os brasileiros residentes no exterior terão preferência aos estrangeiros, nos casos de adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 3o A adoção internacional pressupõe a intervenção das Autoridades Centrais Estaduais e Federal em matéria de adoção internacional. (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
A respeito da matéria, o Código Civil trata da adoção por estrangeiro no artigo 1.629.
Pela Convenção de Haia, ocorre adoção internacional “quando uma criança com residência habitual em um Estado Contratante (Estado de origem) tiver sido, for, ou deva ser deslocada para outro Estado Contratante (Estado de destino), quer após a sua adoção no Estado de origem por cônjuges ou por pessoa residente habitualmente no Estado de acolhida, quer para que essa adoção seja realizada, no Estado de acolhida ou no Estado de origem” (artigo 2º, I). É também considerada internacional a adoção em que os pais são brasileiros, mas residem no exterior e para lá pretendem levar o adotado.
A conduta de promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro configura o crime previsto no artigo 239, ECA.
9.42. Requisitos da Adoção Internacional:
Art. 52. A adoção internacional observará o procedimento previsto nos arts. 165 a 170 desta Lei, com as seguintes adaptações: (Redação dada pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - a pessoa ou casal estrangeiro, interessado em adotar criança ou adolescente brasileiro, deverá formular pedido de habilitação à adoção perante a Autoridade Central em matéria de adoção internacional no país de acolhida, assim entendido aquele onde está situada sua residência habitual; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - se a Autoridade Central do país de acolhida considerar que os solicitantes estão habilitados e aptos para adotar, emitirá um relatório que contenha informações sobre a identidade, a capacidade jurídica e adequação dos solicitantes para adotar, sua situação pessoal, familiar e médica, seu meio social, os motivos que os animam e sua aptidão para assumir uma adoção internacional; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
III - a Autoridade Central do país de acolhida enviará o relatório à Autoridade Central Estadual, com cópia para a Autoridade Central Federal Brasileira; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
IV - o relatório será instruído com toda a documentação necessária, incluindo estudo psicossocial elaborado por equipe interprofissional habilitada e cópia autenticada da legislação pertinente, acompanhada da respectiva prova de vigência; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
V - os documentos em língua estrangeira serão devidamente autenticados pela autoridade consular, observados os tratados e convenções internacionais, e acompanhados da respectiva tradução, por tradutor público juramentado; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
VI - a Autoridade Central Estadual poderá fazer exigências e solicitar complementação sobre o estudo psicossocial do postulante estrangeiro à adoção, já realizado no país de acolhida; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
VII - verificada, após estudo realizado pela Autoridade Central Estadual, a compatibilidade da legislação estrangeira com a nacional, além do preenchimento por parte dos postulantes à medida dos requisitos objetivos e subjetivos necessários ao seu deferimento, tanto à luz do que dispõe esta Lei como da legislação do país de acolhida, será expedido laudo de habilitação à adoção internacional, que terá validade por, no máximo, 1 (um) ano; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
VIII - de posse do laudo de habilitação, o interessado será autorizado a formalizar pedido de adoção perante o Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra a criança ou adolescente, conforme indicação efetuada pela Autoridade Central Estadual. (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o Se a legislação do país de acolhida assim o autorizar, admite-se que os pedidos de habilitação à adoção internacional sejam intermediados por organismos credenciados. (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o Incumbe à Autoridade Central Federal Brasileira o credenciamento de organismos nacionais e estrangeiros encarregados de intermediar pedidos de habilitação à adoção internacional, com posterior comunicação às Autoridades Centrais Estaduais e publicação nos órgãos oficiais de imprensa e em sítio próprio da internet. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 3o Somente será admissível o credenciamento de organismos que: (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - sejam oriundos de países que ratificaram a Convenção de Haia e estejam devidamente credenciados pela Autoridade Central do país onde estiverem sediados e no país de acolhida do adotando para atuar em adoção internacional no Brasil; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - satisfizerem as condições de integridade moral, competência profissional, experiência e responsabilidade exigidas pelos países respectivos e pela Autoridade Central Federal Brasileira; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
III - forem qualificados por seus padrões éticos e sua formação e experiência para atuar na área de adoção internacional; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
IV - cumprirem os requisitos exigidos pelo ordenamento jurídico brasileiro e pelas normas estabelecidas pela Autoridade Central Federal Brasileira. (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 4o Os organismos credenciados deverão ainda: (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
I - perseguir unicamente fins não lucrativos, nas condições e dentro dos limites fixados pelas autoridades competentes do país onde estiverem sediados, do país de acolhida e pela Autoridade Central Federal Brasileira; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
II - ser dirigidos e administrados por pessoas qualificadas e de reconhecida idoneidade moral, com comprovada formação ou experiência para atuar na área de adoção internacional, cadastradas pelo Departamento de Polícia Federal e aprovadas pela Autoridade Central Federal Brasileira, mediante publicação de portaria do órgão federal competente; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
III - estar submetidos à supervisão das autoridades competentes do país onde estiverem sediados e no país de acolhida, inclusive quanto à sua composição, funcionamento e situação financeira; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
IV - apresentar à Autoridade Central Federal Brasileira, a cada ano, relatório geral das atividades desenvolvidas, bem como relatório de acompanhamento das adoções internacionais efetuadas no período, cuja cópia será encaminhada ao Departamento de Polícia Federal; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
V - enviar relatório pós-adotivo semestral para a Autoridade Central Estadual, com cópia para a Autoridade Central Federal Brasileira, pelo período mínimo de 2 (dois) anos. O envio do relatório será mantido até a juntada de cópia autenticada do registro civil, estabelecendo a cidadania do país de acolhida para o adotado; (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
VI - tomar as medidas necessárias para garantir que os adotantes encaminhem à Autoridade Central Federal Brasileira cópia da certidão de registro de nascimento estrangeira e do certificado de nacionalidade tão logo lhes sejam concedidos. (Incluída pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 5o A não apresentação dos relatórios referidos no § 4o deste artigo pelo organismo credenciado poderá acarretar a suspensão de seu credenciamento. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 6o O credenciamento de organismo nacional ou estrangeiro encarregado de intermediar pedidos de adoção internacional terá validade de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 7o A renovação do credenciamento poderá ser concedida mediante requerimento protocolado na Autoridade Central Federal Brasileira nos 60 (sessenta) dias anteriores ao término do respectivo prazo de validade. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 8o Antes de transitada em julgado a decisão que concedeu a adoção internacional, não será permitida a saída do adotando do território nacional. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 9o Transitada em julgado a decisão, a autoridade judiciária determinará a expedição de alvará com autorização de viagem, bem como para obtenção de passaporte, constando, obrigatoriamente, as características da criança ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo, eventuais sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a aposição da impressão digital do seu polegar direito, instruindo o documento com cópia autenticada da decisão e certidão de trânsito em julgado. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 10. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá, a qualquer momento, solicitar informações sobre a situação das crianças e adolescentes adotados. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 11. A cobrança de valores por parte dos organismos credenciados, que sejam considerados abusivos pela Autoridade Central Federal Brasileira e que não estejam devidamente comprovados, é causa de seu descredenciamento. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 12. Uma mesma pessoa ou seu cônjuge não podem ser representados por mais de uma entidade credenciada para atuar na cooperação em adoção internacional. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 13. A habilitação de postulante estrangeiro ou domiciliado fora do Brasil terá validade máxima de 1 (um) ano, podendo ser renovada. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 14. É vedado o contato direto de representantes de organismos de adoção, nacionais ou estrangeiros, com dirigentes de programas de acolhimento institucional ou familiar, assim como com crianças e adolescentes em condições de serem adotados, sem a devida autorização judicial. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 15. A Autoridade Central Federal Brasileira poderá limitar ou suspender a concessão de novos credenciamentos sempre que julgar necessário, mediante ato administrativo fundamentado. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Em razão da excepcionalidade e do risco representado pela adoção internacional, as exigências são maiores que para a nacional. Além dos requisitos exigíveis aos nacionais (artigo 29, ECA), deverão ser preenchidas as condições previstas no artigo 52, ECA.
9.43. Situação Jurídica:
Para que seja deferida a adoção internacional, é preciso que a criança ou o adolescente esteja com sua situação jurídica definida, ou seja, com sentença transitada em julgado decretando a perda do poder familiar, ou em situação que dispense o consentimento (artigos 45 e 169, ECA e artigo 1.624, CC).
9.44. Impossibilidade de Concessão de Guarda Provisória (artigo 52, § 8º, ECA):
A impossibilidade de concessão da guarda provisória na adoção internacional tem recebido algumas críticas. Carlos Eduardo Pachi questiona: “Como compatibilizar a posse de uma criança ou adolescente pelo estrangeiro, mormente pelo fato de a adoção internacional sempre suscitar dúvidas de sua regularidade? Imagine-se a situação de um cidadão alemão, que não fale o português, sendo parado na via pública, pela polícia, na companhia de criança brasileira. Fatalmente, acabará levado à Delegacia de Polícia e irá aparecer nos noticiários sensacionalistas como ‘traficante de menores’ antes que tudo se esclareça. A solução é a expedição de um termo de responsabilidade”.
9.45. Sentença de Concessão da Adoção (artigo 52, §§ 8º e 9º, ECA).

Art. 52-A. É vedado, sob pena de responsabilidade e descredenciamento, o repasse de recursos provenientes de organismos estrangeiros encarregados de intermediar pedidos de adoção internacional a organismos nacionais ou a pessoas físicas. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Parágrafo único. Eventuais repasses somente poderão ser efetuados via Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente e estarão sujeitos às deliberações do respectivo Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)

Art. 52-B. A adoção por brasileiro residente no exterior em país ratificante da Convenção de Haia, cujo processo de adoção tenha sido processado em conformidade com a legislação vigente no país de residência e atendido o disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da referida Convenção, será automaticamente recepcionada com o reingresso no Brasil. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o Caso não tenha sido atendido o disposto na Alínea “c” do Artigo 17 da Convenção de Haia, deverá a sentença ser homologada pelo Superior Tribunal de Justiça. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o O pretendente brasileiro residente no exterior em país não ratificante da Convenção de Haia, uma vez reingressado no Brasil, deverá requerer a homologação da sentença estrangeira pelo Superior Tribunal de Justiça. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)

Art. 52-C. Nas adoções internacionais, quando o Brasil for o país de acolhida, a decisão da autoridade competente do país de origem da criança ou do adolescente será conhecida pela Autoridade Central Estadual que tiver processado o pedido de habilitação dos pais adotivos, que comunicará o fato à Autoridade Central Federal e determinará as providências necessárias à expedição do Certificado de Naturalização Provisório. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 1o A Autoridade Central Estadual, ouvido o Ministério Público, somente deixará de reconhecer os efeitos daquela decisão se restar demonstrado que a adoção é manifestamente contrária à ordem pública ou não atende ao interesse superior da criança ou do adolescente. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
§ 2o Na hipótese de não reconhecimento da adoção, prevista no § 1o deste artigo, o Ministério Público deverá imediatamente requerer o que for de direito para resguardar os interesses da criança ou do adolescente, comunicando-se as providências à Autoridade Central Estadual, que fará a comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira e à Autoridade Central do país de origem. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)

Art. 52-D. Nas adoções internacionais, quando o Brasil for o país de acolhida e a adoção não tenha sido deferida no país de origem porque a sua legislação a delega ao país de acolhida, ou, ainda, na hipótese de, mesmo com decisão, a criança ou o adolescente ser oriundo de país que não tenha aderido à Convenção referida, o processo de adoção seguirá as regras da adoção nacional. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)

Capítulo 10 – Do Direito à Educação, à Cultura, ao Esporte e ao Lazer.

10.1. Direito à Educação:
Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - direito de ser respeitado por seus educadores;
III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores;
IV - direito de organização e participação em entidades estudantis;
V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.
Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais.
A educação é a base para o desenvolvimento de qualquer nação civilizada e dela decorrem os fatores que propiciam o pleno exercício da cidadania e da liberdade. Lamentavelmente, muito pouco se fez até o momento para melhorar sua qualidade.
O dispositivo baseia-se no enunciado dos artigos 205 e 206 da Constituição Federal, e tem por objetivo promover o correto desenvolvimento intelectual da criança e do adolescente para que possam concorrer no mercado de trabalho e exercer de modo pleno a sua cidadania.
10.2. Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola:
Toda criança e adolescente tem o direito de obter matrícula em estabelecimento de ensino público ou privado (artigo 206, I, CF), em igualdade de condições, vedada qualquer forma de discriminação.
Quaisquer transgressões poderão configurar o crime previsto no artigo 6º da Lei nº. 7.716/1989, se motivadas por preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (artigo 1º do mesmo diploma).
10.3. Direito de ser respeitado por seus educadores:
O menor deve ser respeitado pelos seus educadores, assim entendidos professores, pedagogos, diretores dos estabelecimentos de ensino e todos os profissionais que tenham participação no processo de desenvolvimento moral e intelectual do menor. Não é admissível, por exemplo, que o professor utilize termos pejorativos ou que possam causar constrangimento para referir-se aos seus educandos. O desrespeito pode configurar o crime previsto no artigo 232, ECA.
10.4. O direito de contestar critérios avaliativos:
Embora o professor tenha liberdade para estabelecer seus próprios critérios de avaliação, os alunos têm a possibilidade de solicitar revisão de provas ou recorrer às instâncias escolares superiores para pedir a revisão das regras colocadas pelo mestre. Isso não significa que os educadores devem tolerar toda sorte de abusos por parte dos alunos.
10.5. Direito de organização e participação em entidades estudantis:
Corolário da liberdade de associação (artigo 5º, XVII, CF), o direito de organização e participação em entidades estudantis é reforçado pelo Estatuto, podendo ser exercido independentemente da aquiescência da administração da escola.
10.6. Acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência:
Norma de difícil concretização, vem sendo sistemática e impunemente descumprida pelo Poder Público.
Em decorrência da carência de estabelecimentos de ensino, os pais têm de matricular seus filhos em escolas distantes ou até mesmo em locais diversos, separando irmãos, em prejuízo da convivência familiar preconizada pelo Estatuto.
Cabe ao Ministério Público a busca de medidas administrativas e judiciais que possam compelir o Poder Público a minimizar o problema.
10.7. Direito dos pais de acompanhar o processo pedagógico (artigo 53, parágrafo único, ECA).
10.8. Dever do Estado:
Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:
I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade;
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador;
VII - atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.
§ 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente.
§ 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela freqüência à escola.
O dispositivo é cópia integral do artigo 208 da Constituição Federal.
A falha do Poder Público em implementar políticas educacionais tendentes a atender aos preceitos constitucionais pode caracterizar responsabilidade civil e administrativa do agente a quem se atribua a ação ou omissão danosas (artigos 54, § 2º, e 216, ECA).
10.9. Responsabilidade dos entes estatais na política de educação:
O artigo 211 da Constituição Federal dividiu a responsabilidade de organização do sistema de ensino entre União, Estados e Municípios.
Lamentavelmente, o Brasil vem ignorando por completo a derrocada do ensino público, esquecendo-se de que jamais atingirá as condições dos países do Primeiro Mundo sem alocar recursos necessários à educação.
O esgotamento da rede pública de ensino não permite ao Estado ofertar a todas as crianças e adolescentes carentes os bens e serviços preconizados pelo Estatuto. A precária merenda escolar, o material didático-escolar, transporte e assistência à saúde, não passam de mera carta de intenções do legislador.
10.10. Ensino noturno (artigo 54, VI, ECA):
O Estatuto estimula os cursos noturnos para os adolescentes trabalhadores, como forma de garantir bom desenvolvimento em termos educacionais e profissionais.
10.11. Obrigação dos pais:
Art. 55. Os pais ou responsável têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino.
Decorrência do exercício do poder familiar (artigo 22, ECA), cabe aos pais ou responsável legal a obrigação de matricular nos estabelecimentos de ensino os filhos ou pupilos em idade escolar (artigo 1.634, I, CC).
O descumprimento injustificado desta obrigação pode ensejar a perda ou a suspensão do poder familiar (artigo 24, ECA), o crime de abandono intelectual (artigo 246, CP) ou a infração administrativa prevista no artigo 249 do Estatuto.
Veja, ainda, o artigo 129, V, ECA.
10.12. Comunicações obrigatórias:
Art. 56. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de:
I - maus-tratos envolvendo seus alunos;
II - reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares;
III - elevados níveis de repetência.
O artigo elenca algumas comunicações obrigatórias que devem ser feitas ao Conselho Tutelar, para que sejam tomadas as providências cabíveis em face de possível violação de direitos da criança ou do adolescente (artigo 136, ECA).
O Conselho Tutelar é o órgão que tem por atribuições atender a crianças e adolescentes em situação de risco (artigo 98, ECA), aplicando-lhes medidas protetivas (artigo 101, I a IX, ECA), bem como orientar os pais ou responsável, aplicando as medidas a eles pertinentes (artigo 129, I a X, ECA).
Nada impede que as comunicações sejam feitas ao Ministério Público ou ao juiz da infância e da juventude.
“Enquanto não instalados os Conselhos Tutelares, as atribuições a eles conferidas serão exercidas pela autoridade judiciária” (artigo 262, ECA).
O inciso I reproduz a obrigação prevista no artigo 13 do Estatuto, com relação à ocorrência de maus-tratos. Não é necessária a constatação efetiva dos abusos, bastando a mera suspeita de que estejam ocorrendo.
Além de informar sobre eventuais maus-tratos, devem também ser comunicados os elevados níveis de repetência, a evasão escolar e a reiteração de faltas injustificadas. Essas comunicações permitem ao Poder Público o acompanhamento e a identificação das causas para poder estabelecer projetos voltados à melhoria do ensino.
10.13. Estímulo a novas técnicas de ensino:
Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas propostas relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação, com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino fundamental obrigatório.
Também previsto no artigo 214 da Constituição Federal.
Sabedor de que o ensino tradicional vem perdendo espaço para as novas tendências educacionais, aplicadas na rede particular de ensino, o legislador do Estatuto pretendeu estimular a aplicação dessas técnicas também na escola pública.
Em que pese a boa intenção de buscar novos caminhos, se o Estado procurasse ao menos implementar de fato o ensino tradicional, já daria um grande passo.
10.14. Respeito ao contexto sociocultural do menor:
Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.
Também previsto no artigo 210 da Constituição Federal.
O dispositivo busca evitar a massificação do ensino, preservando as peculiaridades regionais para que a criança e o adolescente não percam a identidade com sua nação e região.
10.15. Parcela de responsabilidade do Município:
Art. 59. Os municípios, com apoio dos estados e da União, estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.
Veja os artigos 211, § 2º, e 227, Constituição Federal, em conjunto com o artigo 4º, letras c e d, ECA.

Capítulo 11 – Do Direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho.

11.1. Idade mínima para o trabalho:
Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz. (Vide Constituição Federal)
Revogado pela Emenda Constitucional nº. 20/1998, que, alterando a redação do artigo 7º, XXXIII, da Constituição, elevou para 16 anos a idade mínima para o trabalho dos menores, salvo na condição de aprendiz para os maiores de 14 anos (artigo 227, § 3º, I, CF).
11.2. Regras de proteção do trabalho do menor:
Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação especial, sem prejuízo do disposto nesta Lei.
A Constituição garante o direito à profissionalização (artigo 227, caput), a idade mínima de 14 anos para admissão ao trabalho como aprendiz (artigos 7º, XXXIII, e 227, § 3º, I), direitos previdenciários e trabalhistas e garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola (artigo 227, § 3º, II e III).
As disposições específicas que regulam o trabalho do adolescente podem ser encontradas nos artigos 402 a 441 da Consolidação das Leis do Trabalho.
Além disso, as atividades exercidas devem respeitar a condição peculiar da pessoa em desenvolvimento e objetivar a capacitação profissional e adequação ao mercado de trabalho (artigo 69, ECA).
11.3. Salário do menor:
De acordo com a Súmula nº. 205 do STF, ao menor não aprendiz (16 a 18 anos) deve ser pago salário-mínimo integral.
11.4. Trabalho do menor de 16 anos:
O menor de 16 anos não aprendiz que trabalha, ainda que irregularmente em face do que dispõe a legislação vigente, tem direito a salário.
11.5. Aprendiz:
Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação técnico-profissional ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor.
A legislação específica, entretanto, trata apenas da educação profissional e tecnológica em geral (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº. 9.394/1996, artigos 39 a 42, modificada pela Lei nº. 11.741/2008), silenciando a respeito do tema aprendizagem, o que demonstra a necessidade de regulamentação.
11.6. Princípios da formação técnico-profissional:
Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos seguintes princípios:
I - garantia de acesso e freqüência obrigatória ao ensino regular;
II - atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente;
III - horário especial para o exercício das atividades.
O inciso I reproduz o artigo 227, § 3º, III, CF.
O inciso II fala em atividade compatível, assim entendida aquela que respeita a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento (artigo 69, I, ECA). Veja também os artigos 403 a 405 e 424 a 433, CLT, e artigo 67, ECA.
Por fim, o inciso III preconiza horário especial para o exercício das atividades. De modo geral, é proibido o trabalho noturno, assim entendido o executado entre as 22 horas e 5 horas (artigos 404, CLT, e 67, I, ECA), ou que dificulte a freqüência escolar (artigo 67, IV, ECA).
11.7. Bolsa de aprendizagem:
Art. 64. Ao adolescente até quatorze anos de idade é assegurada bolsa de aprendizagem.
O artigo 64, ECA, deve ser analisado de acordo com a nova ótica constitucional, aplicando-se aos adolescentes entre 14 e 16 anos de idade.
A questão da bolsa ao aprendiz deveria ser regulada pela Lei de Diretrizes e Bases, que, como dito, silencia sobre o tema.
O salário do adolescente aprendiz é fixado pelo artigo 80, CLT, em meio-salário mínimo na primeira metade do aprendizado e 2/3 na segunda metade.
11.8. Aprendiz em idade de trabalho:
Art. 65. Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários.
À luz da Emenda Constitucional nº. 20/1998, deve ser aplicado ao adolescente entre 16 e 18 anos.
11.9. Portador de deficiência:
Art. 66. Ao adolescente portador de deficiência é assegurado trabalho protegido.
A norma deriva do mandamento constitucional disposto no artigo 227, § 1º, II, CF.
A questão do menor deficiente é tema por demais importante e complexo para ser tratado no âmbito do Estatuto, impondo-se a edição de lei especial que possa disciplinar a matéria.
11.10. Trabalhos vedados ao menor:
Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho:
I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte;
II - perigoso, insalubre ou penoso;
III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
IV - realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
Os artigos 404 a 406, CLT, ampliam o rol de vedações.
As atividades consideradas insalubres ou perigosas estão indicadas nos artigos 189 a 197, CLT.
Se o trabalho executado pelo adolescente for prejudicial à sua saúde, ao seu desenvolvimento físico ou à sua moralidade, a autoridade competente pode obrigá-lo a abandonar o serviço, devendo a respectiva empresa, quando for o caso, proporcionar ao menor todas as facilidades para a mudança de funções (artigo 407, CLT).
A fiscalização das normas de proteção ao adolescente aprendiz ou trabalhador fica a cargo do Ministério do Trabalho.
11.11. Parâmetros do ensino profissionalizante:
Art. 68. O programa social que tenha por base o trabalho educativo, sob responsabilidade de entidade governamental ou não-governamental sem fins lucrativos, deverá assegurar ao adolescente que dele participe condições de capacitação para o exercício de atividade regular remunerada.
§ 1º Entende-se por trabalho educativo a atividade laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo.
§ 2º A remuneração que o adolescente recebe pelo trabalho efetuado ou a participação na venda dos produtos de seu trabalho não desfigura o caráter educativo.
Em alguns casos, o adolescente pode ficar sob responsabilidade de entidade governamental ou não (artigo 90, ECA), quer sob o regime de abrigo, quer em decorrência da prática de ato infracional. Em qualquer dos casos, deve ter ele acesso à atividade educativa visando a sua capacitação para o mercado de trabalho.
11.12. Parâmetros para o trabalho do adolescente:
Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros:
I - respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
II - capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho.