sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

PERÍODO HELENÍSTICO

O período que separa Aristóteles, no final do século IV a.C. até o domínio de Roma é chamado período helenístico. Este período durou cerca de 300 anos e é assinalado pela prevalência do problema moral. É chamado período helenístico porque, em decorrência das conquistas de Alexandre Magno, surgiu uma comunidade internacional, na qual a cultura e a língua grega predominaram nos três grandes reinos helênicos, a Macedônia, a Síria e o Egito, unificados à civilização grega, ocorrendo também grandes transformações políticas. Vários fatos ocorridos nesse período são de fundamental importância, dentre os quais citamos:



1)A desintegração da pólis, após a conquista de Alexandre Magno, acabando com a concepção da vida política e auto-suficiente da cidade-Estado; a diáspora do mundo grego, quando a polis cede lugar aos grandes impérios;



2)A cultura grega torna-se patrimônio cumum de todos os países do Mediterrâneo, dominando gradualmente Egito e Síria, alcançando Roma e Espanha, tanto nos meios judeus esclarecidos como na nobreza romana. A língua grega, sob a forma de koiné, ou dialeto comum, é o órgão dessa cultura. A influência grega se faz sentir até no extremo Oriente.



3)A expansão do mundo civilizado e o aparecimento de novas escolas e centros de estudo a rivalizarem com Atenas em cultura e civilização, tais como Roma, Alexandria, Antióquia, Pérgamo, Rodes. A absorção do mundo grego pelo mundo romano e a concentração na civilização romana.



4)O preponderante papel da ética e a busca de felicidade interior;


5)A dispersão dos conhecimentos, que se caracterizará pelo caráter escolástico (de escola) num processo de institucionalização da Filosofia;


6)A decadência evidenciada pelo esfacelamento do academicismo e pela oposição das escolas entre si, a destruírem valores éticos tradicionais;


7)O desenvolvimento do espírito romano e a nova atitude da consciência frente à natureza, ao direito e ao Estado;


8)A ascensão paulatina das religiões orientais e do cristianismo;


9)Desaparecem as fronteiras entre diferentes países e culturas. A cidade de Alexandria, no Egito, ponto de convergência entre Ocidente e Oriente, passou a desempenhar papel relevante. Possuindo imensa biblioteca, passou a ser o centro de estudos de matemática, astronomia, biologia e medicina.


10) Durante o helenismo surgem novas religiões, que emprestavam das diferentes culturas antigas suas concepções religiosas, num sincretismo religioso. As novas religiões pregavam a salvação para a morte, a imortalidade da alma, a esperança da vida eterna.

Na filosofia, Sócrates, Platão e Aristóteles tornaram-se fontes de inspiração das orrentes surgidas e investigava-se os problemas por eles levantados: Qual a melhor maneira do homem viver ? Em que consiste a verdadeira felicidade ? Como ela pode ser alcançada ?

A Ética tornou-se a parte mais importante da Filosofia. Esse período da busca da felicidade durará até o advento do cristianismo, que imprimiu nova força ao pensamento antigo, mas já então a filosofia penetrará no Estado-império romano, cristalizando a idéia do Direito natural que irá impregnar a juris prudentia romana.



A Escola Cínica:


O fundador da escola cínica foi Antístenes de Atenas, discípulo de Górgias e depois devotado seguidor de Sócrates, o qual fundou um ginásio na praça do Cão ágil. Daí o nome de cínicos (cães, ou melhor, caninos) que se deu aos adeptos e que estes ostentaram com certo orgulho.



Os cínicos exageraram o lado ascético da doutrina de Sócrates, sobretudo da eudaimonia (felicidade), conferindo a mesma um caráter inclusive negativo, e combateram o idealismo platônico, repelindo o mundo das Idéias e afirmando serem os conceitos apenas nomes vazios de conteúdo. Pregaram um ideal ético da tranqüilidade, da ausência total de turbações (apatia), bem como uma indiferença total pelos bens materiais, pela riqueza, honra e glórias. O sábio liberta-se de todas as realidades que dele não dependem, limitando-se às necessidades escritas e vitais. O prazer não tinha valor, podendo mesmo ser prejudicial: comida, bebida, calor e sexo eram necessidades a serem satisfeitas, mas com um mínimo de alegria, segundo Xenofonte.



A felicidade não depende de fatores externos como o luxo, o poder político e a boa saúde. A verdadeira felicidade consistia em se libertar dessas coisas e não se preocupar com a saúde, o sofrimento e a morte. O cínico era insensível diante do sofrimento e da morte.



Para os cínicos, o sábio basta-se a si mesmo, prescindindo da família e da pátria, reduzindo as necessidades ao mínimo: quando tem fome, pede esmolas. Isso levou o imperador Juliano a indagar se o cinismo era doutrina filosófica ou gênero de vida.



A filosofia jurídica dos cínicos foi revolucionária, realizando, tal como a ala radical dos sofistas, uma crítica das instituições e valores sociais da época. Aristóteles considerava Antístenes e seus seguidores como incultos e tolos.


As leis são normas convencionais, opondo-se à ordem natural, que não admite desigualdades entre os homens. Se um homem é escravo e outro é livre, isso decorre apenas da lei convencional, visto que pela natureza, não existe qualquer diferença entre eles. A polis (Estado), não tem qualquer significação, pois o homem é kosmopolita (cidadão do mundo). O ideal seria um estado de natureza, sem nenhuma convenção. Muitas das idéias dos cínicos passaram para a escola estóica.




Escola Epicurea:




Fundada por Epicuro em Atenas, apesar dele ter sido educado em Samos. No seu Jardim, em Atenas, estabeleceu sua escola que teve longa duração e sua tradição passou à Roma e estendeu-se até o século IV d.C., embora com escasso prestígio nos últimos tempos.



Adotavam a teoria atomista de Demócrito, aperfeiçoando-a com algumas modificações. A realidade é um conjunto de coisas materiais, cujos movimentos são regidos pelo acaso. O homem é um ser material, aspira ao prazer e foge do sofrimento. O critério divino é o prazer. A felicidade reside no prazer, material ou espiritual. Mas o homem não deve procurar as delícias da carne, e sim a sua libertação de todos os problemas pela serenidade (ataraxia). Esse prazer é pois, avaliado pela razão, refletido e mediato, escolhido com prudência e sabedoria, não se confundindo com o gozo grosseiro dos sentidos. “Fluir aquilo que a vida oferece sem temor ou pena”.



O prazer é sempre acompanhado do sofrimento e busca-se o prazer quando se sente necessidade ou dor, fome ou sede. Se a dor desaparece, cessa-se a busca, deduzindo-se que o mais elevado grau de prazer, tal como é estabelecido pela natureza, não é mais que a supressão da dor. Entre o prazer e a dor não existe estado de indiferença. A felicidade plena, que resulta da serenidade (ataraxia), somente pode ser atingida evitando-se ao máximo os prazeres. O supremo bem consiste em não sentir necessidades, que devem ser reduzidas ao indispensável à existência.



Assim, para os epicuristas, o prazer é algo negativo, é a ausência de dor (vitória sobre a dor, no sentido de ultrapassamento da dor). Não há o que temer pelo nosso destino após a morte, como não há o que temer pelo nosso sofrimento, pois não podemos compreender tanto a morte como o sofrimento. A morte é a conseqüência das coisas naturais e o sofrimento é algo de que só podemos fugir com força ou fortaleza intelectual.



A virtude não é um fim, mas um meio de o atingir, pois o fim é o prazer tranqüilo, meio de segurança para nos preservarmos das dores e sofrimentos. A maior virtude é a prudência “mais preciosa do que a própria filosofia”.



A justiça, enquanto virtude, participa desse mesmo caráter: é instrumento e não medida do que deve caber a cada um; é o meio de evitar a dor, jamais prejudicando a quem quer que seja. É feita de convenções positivas, pelas quais os homens se empenham em não se prejudicarem mutuamente. Com a aceitação das leis, cada um se protege individualmente contra a injustiça, mas sem escrúpulos de violá-la se algum interesse houver e se possa fazer impunemente.


Essa doutrina moral conduzia a uma posição individualista e céptica no terreno político-jurídico. O Direito é necessário para a vida social e a segurança dos homens. Ao filósofo cabe aceitar as suas normas positivas, sem indagar do seu conteúdo ético nem preocupar-se em modificá-las. O homem não é um ser eminentemente social, como queria Aristóteles. Ao contrário, lutou desde o início, viviam isolados e em luta, uns contra os outros, até que o Estado e o Direito surgiram e os homens uniram-se voluntariamente em um acordo ditado pela utilidade, estabelecendo regras de convivência baseada no interesse recíproco. Epicuro aceita o convencionalismo dos sofistas, sem orientar-se para o cosmopolitismo dos estóicos.


O Direito é o meio técnico de se efetivar essa moral do prazer tranqüilo, porque prescreve as ações que proporcionam a felicidade ao maior número de pessoas e proíbe as ações prejudiciais. O direito e a justiça não passam de convenções que repousam em pactos, causadas pela necessidade da vida social, e não algo inerente à natureza humana. Epicuro dizia que o Direito Natural é uma convenção excogitada pelos homens em vista a sua utilidade a fim de que não se prejudiquem uns aos outros. Assim, a teoria dos epicuristas, juntamente com a dos sofistas Licófron e Hípias de Élis, é precursora da Teoria do Contrato Social.


Escola Estóica



Apesar da nova situação criada pela hegemonia macedônica, Atenas permanece o centro da filosofia, mas entre os novos filósofos, nenhum é ateniense, nem mesmo grego continental. Todos os estóicos conhecidos, do século III, são metecos vindos de regiões fronteiriças ao helenismo, sofrendo influências helênicas e não-heleênicas, particularmente dos novos vizinhos de raça semítica e indiferentes à política local das cidades gregas.



Depois da morte de Alexandre, a Grécia tornou-se um campo de batalha político onde se defrontavam os seus sucessores, especialmente os reis da macedônia e os Ptolomeus. A Constituição das cidades mudava segundo a vontade dos poderosos do dia que, de acordo com o caso, apoiavam-se nos partidos oligárquico ou democrático. Os romanos, no ano de 200, libertaram os atenienses do domínio macedônico, para fazê-los dependentes de seu próprio domínio.



Esse é o pano de fundo onde se desenrola a história da antiga escola estóica, fundada por Zenão de Cítio, provavelmente um fenício, originário da ilha de Chipre, que se transferiu para Atenas ainda jovem, depois de ter sobrevivido a um naufrágio, em aproximadamente, princípios do século III a.C.



A escola que perdurou até o século II d.C., passando da Grécia para Roma, onde obteve larga difusão e grande importância. A palavra estóico, vem de stoá, “pórtico”, porque Zenão ensinava no Pórtico Pintado de Polignoto, em Atenas (Stoá Poikile).


Zenão, em sua obra “República” (Politeia), defende a criação de um Estado mundial onde não haveria dinheiro, tribunais, templos ou estádios e as mulheres pertenceriam a todos.


Costuma-se distinguir cronologicamente, três grupos dentro dessa escola: 1) estoicismo antigo, que corresponde ao período helenístico e teve como principais representantes, Zenão de Cítio, Cleantes de Asso e Crisipo de Sólis. Assim como Heráclito, professavam uma doutrina materialista dinâmica de caráter panteísta, pela qual o fundamento da realidade seria um alento ou sopro (pneuma), alma do mundo, princípio ativo, mas que era, como o logos de Heráclito, um espírito universal, reunindo em si razões seminais (logoi spermatikoi) de todas as coisas. Todas as pessoas eram parte da mesma razão universal, do mesmo logos. Do logos deriva a lei de duas faces: a lei natural do mundo físico e a lei natural das ações. O homem é um microcosmos, em face ao macrocosmos.



Os estóicos tornaram explícito o fundamento da doutrina natural de Aristóteles, identificando o Direito natural com a justiça, e a justiça com a razão. Isso levou a idéia de um direito universalmente válido, o assim chamado Direito Natural. O logos divino, a razão que rege o universo, mora em todos os homens, sem qualquer distinção. O lema ético que regia os estóicos é “viver segundo a natureza”. O Deus dos estóicos não é olímpico, mas um Deus que vive em sociedade com os homens, animais, vegetais e todas as coisas.



Para os estóicos, a virtude do sábio não é a assimilação de Deus, como queria Platão, nem a simples virtude cívica e política que desejava Aristóteles. É a aceitação da obra divina e a colaboração a essa obra graças à inteligência que dela toma o sábio.


Trata-se da idéia semítica de Deus Todo-Poderoso, governando o destino dos homens e das coisas. A virtude, o bem e a felicidade se identificam. Zenão dá o nome de prudência (phrónesis), virtude fundamental, ao acordo interno consigo mesmo. A coragem é a prudência do que se deve suportar; a temperança, a prudência na escolha das coisas; a justiça, a prudência na atribuição das partes.


A justiça (dikaiosyne) é uma das quatro virtudes cardeais, definida por Crisipo como “a ciência de distribuir o que é devido a cada um”, e baseada na natureza, não na convenção.


Os princípios morais fundamentais do estoicismo antigo são:


- A virtude consiste na felicidade (eudaimonia), bem supremo, que se alcança com a vida da natureza; a natureza do homem é racional. Natureza e razão se harmonizam; a virtude se identifica com a sabedoria. A felicidade consiste, pois, no exercício constante da virtude, na própria auto-suficiência que permite ao homem desprender-se dos bens externos. O primeiro imperativo ético estóico é viver conforme à Natureza, isto é, conforme à razão, pois o natural é racional.

- A felicidade se funda na teoria da resignação, na aceitação do destino, no combate contra as forças da paixão que produzem a intranqüilidade. Ao resignar-se ao destino, resigna-se também o homem à Justiça, pois o mundo é, já que racional, justo. Não há acaso. Tudo o que acontece é necessário e determinado casualmente. Daí haver uma regulação no universo, a qual o homem não escapa, pois faz parte dele. O homem está sob o mesmo princípio que é razão imanente e que nos determina, razão que regula o mundo e lhe impõe uma só lei (Marco Aurélio, no estoicismo tardio da época romana chamará de Providência, ação da Inteligência).

- O Direito Natural é corolário da natureza racional do homem, logo, está acima do Direito Positivo, porque modelo para delimitar o justo e o injusto.

- A justiça é a maior das virtudes políticas, porque possibilita a convivência entre os homens.

- Os homens são iguais, porque tem a mesma natureza, logo a escravidão é injusta.

- O homem deve ser impassível diante da dor e do sofrimento.

- O adultério não é permitido, para defesa da família e da cidade.

- O que existe é o Estado universal, não a polis (Estado como entidade política nacional).


2. Estoicismo médio – corresponde ao período de transição entre a fase helenística e a romana, teve como principais representantes Panécio de Rodes (que transporta à Roma o estoicismo), Posidônio de Apaméia (que forneceu meios aos romanos de justificar filosoficamente a existência do império). Nesse período, os estóicos preocupam-se com doutrinas de sentido místico-religioso; 3. Novo estoicismo – ou estoicismo romano, cujos principais nomes foram: Sêneca, Epicteto, Caio Mussonio Rufo e Marco Aurélio.



Fonte: Fornecido por Jorge Sarmento.

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